Por: Mateus Ferraz
As Lições do Silêncio
Recentemente fui extremamente impactado pela história de um jovem chamado Adam, contada por Henri Nouwen em seu livro, “Adam, o Amado de Deus”. Nesse livro o autor conta como deixou sua posição de professor em uma das maiores universidades dos EUA para dedicar-se integralmente à obra de tomar conta de pessoas com deficiências em Toronto, no Canadá.
Dentre todas as pessoas de quem cuidou estava Adam, um jovem que devido a um complicado quadro de epilepsia, permanecia em um estado quase catatônico, sendo que exigia um cuidado extremo por parte dos que tomavam conta dele, pois nem mesmo suas atividades básicas podia desenvolver sozinho. Adam não falava uma palavra sequer, nem conseguia expressar-se muito bem, pois não coordenava seus movimentos. Era necessário que Henri gastasse cerca de três horas diárias para prepará-lo com banho, troca de roupa e alimentação para que Adam pudesse ir para as aulas de fisioterapia, natação etc.
É o tipo de quadro que nos leva a pensar: Qual seria a utilidade de uma pessoa como esta no mundo? Se todos temos uma missão dada por Deus a ser desenvolvida, e sabemos que só seremos completos se vivermos em função de tal missão, qual seria a de Adam? De que maneira ele poderia contribuir para que o Reino de Deus se expandisse? Que ensinamentos poderia transmitir? Que vidas poderia influenciar?
Espantosamente, Adam contribuiu muito mais com o seu silêncio do que muitos de nós com nossas palavras e atitudes. É impressionante o mistério revelado na fraqueza. O fato de um homem, que em 34 anos de vida não disse uma palavra sequer, transformar tantas vidas, a tal ponto de seu funeral estar repleto de pessoas marcadas pela sua existência, é um verdadeiro mistério. Mistério para nós que esquecemos o valor da fraqueza, o valor da dependência.
Adam nos ensina algumas coisas essenciais. Coisas que nunca poderiam ser ensinadas em um congresso ou preleção. É necessário uma vida para demonstrá-las. Coisas que para nós são muito vagas e subjetivas, e que Deus precisa ilustrar para podermos compreender. Adam e outros mestres silenciosos são instrumentos de Deus para chamar nossa atenção. Nós, que vivemos em função de um mundo tão barulhento e ganancioso. Que caímos, sem perceber, na teia do sistema capitalista e competitivo em que vivemos. Nós que incorporamos essa vã maneira de viver ao cristianismo e que além disso muitas vezes tiramos dele o próprio Cristo. Nós, que hoje formamos líderes e não servos. Gente extremamente forte, e não dependentes. Precisamos ouvir o brado de Deus que se expressa no silencio dos Adams. Que lições seriam estas?
Creio que a primeira delas seria a lição da dependência. Adam não tinha medo de depender. Parecia confortável com qualquer mão amiga que se estendesse. Adam sabia de suas limitações, e nunca se debateu com elas. Adam sabia receber amor. É interessante como nossa pregação fala de um Deus que é amor, mas nossa vida se recusa a aceitá-lo. Falamos de um Deus de poder, mas ainda assim continuamos a buscar nossas próprias soluções. Nos recusamos a depender. Queremos ter todas as respostas, queremos ser os pioneiros, queremos chegar sozinhos onde ninguém chegou para sermos apontados nas multidões como os poderosos donos de si mesmos.
Deus nos chama à dependência. Deus nos chama à fraqueza. Deus nos chama a compreendermos o verdadeiro valor da graça que nos basta. Ele deseja ser tudo em todos e para isso é necessário que, à semelhança de Adam, sejamos vazios. Vazios e simples em uma sociedade cheia de complicações. Vazios o suficiente para sermos moldados por Deus. Não há problema em ser fraco. Não há problema em não ter todas as respostas.
Normalmente, associamos a fraqueza ao pecado. Não creio que seja esta a conotação. Ser fraco é não ser suficiente em si mesmo e saber que a suficiência vem de Deus. Ser fraco é não saber tudo e aprender onde não se esperaria aprender e com quem não parece ter nada a ensinar. “O meu poder se aperfeiçoa na fraqueza” (2 Co 12.9), diz o Senhor. O nosso poder, por outro lado, é uma resistência à operação de Deus.
Outra lição de Adam é a lição do amor de Deus. Adam era amado por Deus. E as pessoas que tinham contato com ele sentiam esse amor de maneira profunda e pessoal. O amor que um grande empresário nunca conseguira sentir e que uma mulher muito rica nunca conseguira receber. Era esse tipo de gente que Deus ensinava através de Adam.
Ele nos ensina que não podemos medir o amor de Deus com nossas próprias réguas. Ele nos mostra que o amor de Deus não se revela em um corpo perfeito ou em uma vida repleta de luxos. Não podemos nunca questionar a bondade de Deus. Ele foi bom para Adam, ele é bom para cada um de nós. Esse amor é revelado pessoalmente a cada um daqueles que estão dispostos a tirar os olhos desse mundo. Está patente aos olhos daqueles que se desfizeram dos sentimentos de autopreservação de suas imagens.
Este amor não está revelado em sua forma mais profunda nos sinais e maravilhas e nem tampouco nas grandes bênçãos que recebemos. Esse amor está revelado onde ninguém pensaria em procurar. Talvez em uma cadeira de rodas, talvez no leito de um hospital, talvez em uma cruz no alto de um monte.
Não conheci Adam, não sei se estaria pronto para conhecê-lo. Não sei se veria as mesmas qualidades que Henri Nouwen e outros conseguiram enxergar. Talvez estaria ocupado demais tendo compaixão. Talvez esta seria a reação de muitos de nós. Mas as lições de sua vida parecem torná-lo íntimo de cada um que queira conhecer a Deus, e melhor ainda… permitir-se ser amado de Deus.
Respostas de 2
Lindo demais…Eu posso perceber Deus, em cada palavra. Na realidade o legado de Adam, revela o amor falado em silêncio…Porem transmitido em alta voz. A voz do nosso amigo Espírito Santo, nos revelando tamanho amor.
Estou lendo este livro e é um livro muito bom de se ler.