Por: Henri Nouwen
Esperar não é uma atitude muito popular. Esperar não é algo pelo qual as pessoas têm muita simpatia. Na verdade, a maioria das pessoas acha que esperar é uma perda de tempo. Talvez isso se deva ao fato de, basicamente, a nossa cultura resumir-se a: “Ande! Faça alguma coisa! Mostre que é capaz de distinguir-se dos outros! Não se limite a ficar aí, de braços cruzados, esperando!” Para muitas pessoas, esperar é um deserto árido entre o lugar em que se encontram e o lugar para onde querem ir. E as pessoas não gostam de um lugar assim. Querem sair dele fazendo alguma coisa.
Na nossa geração moderna, esperar é ainda mais difícil, porque temos muito medo. Uma das emoções mais presentes na atmosfera que nos rodeia é o medo. As pessoas têm medo: medo dos sentimentos íntimos, medo das outras pessoas e também medo do futuro. Pessoas com medo sofrem ao esperar, porque quando estamos com medo, queremos sair de onde estamos. Mas, se não podemos fugir, ao menos deveríamos poder lutar.
As pessoas que vivem num mundo dominado pelo medo estão mais propensas a reagir de maneira agressiva, hostil e destrutiva do que as pessoas que não têm tanto medo. Quanto mais medo tivermos, mais difícil a espera irá tornar-se. Eis por que esperar é um comportamento tão impopular para tanta gente.
Impressiona-me, portanto, que todas as figuras que aparecem nas primeiras páginas do evangelho de Lucas estejam esperando. Zacarias e Isabel estão esperando. Maria está esperando. Simeão e Ana, que se encontravam no templo quando Jesus foi conduzido para lá, estão esperando. Toda a cena de abertura da Boa Notícia é ocupada por pessoas que estão esperando. E, logo no princípio, todas essas pessoas, de uma forma ou de outra, escutam estas palavras: “Não tenha medo. Tenho boas notícias para você”; o que significa que Zacarias, Isabel, Maria, Simeão e Ana estão esperando que algo de novo e bom lhes aconteça.
Quem são essas figuras? São os representantes da espera pelas promessas a Israel. Os Salmos estão cheios deste tipo de espera. “Minha alma espera em Javé, espera em sua palavra. Minha alma aguarda o Senhor mais que os guardas pela aurora. Mais que os guardas pela aurora, aguarde Israel a Javé. Pois de Javé vem a graça e a redenção em abundância” (Sl 130.5-7). “Minha alma espera pelo Senhor” — é este o tema que percorre todas as páginas das Escrituras hebraicas.
Mas nem todos os que vivem em Israel estão esperando. Com efeito, podemos dizer que os profetas criticaram o povo (pelo menos, parte dele) por não prestar atenção ao que estava por vir. Esperar finalmente se tornou a atitude do resto de Israel, daquele pequeno grupo de israelitas que permaneceu fiel. É o resto purificado do povo fiel que está esperando. Isabel, Zacarias, Maria, Simeão e Ana são os representantes desse resto. Eles foram capazes de esperar, de estar atentos, de viver na expectativa.
Agora, gostaria de chamar a atenção para duas coisas. Primeiro, qual é a natureza da espera? Segundo, qual é a forma de pôr em prática a espera? Como eles estão esperando e como nós somos chamados a esperar com eles?
A Natureza da Espera
Esperar, como vemos na atitude das pessoas nas primeiras páginas do Evangelho, é esperar com o sentido de promessa. “… Zacarias! … a sua esposa Isabel vai ter um filho”. “Maria, … você vai ficar grávida, terá um filho” (cf. Lc 1,13.31). As pessoas que esperam receberam uma promessa que lhes incentiva esperar. Receberam algo que está ocorrendo com elas, como uma semente que começou a crescer. Isso é muito importante. Só podemos realmente esperar se aquilo por que estamos esperando já começou para nós. Por isso, esperar nunca é um movimento do nada para alguma coisa, mas é sempre um movimento de algo para algo mais. Zacarias, Isabel, Maria, Simeão e Ana viviam com uma promessa que os sustentava, os alimentava e os capacitava a ficar onde estavam. E, dessa forma, a promessa podia realizar-se dentro deles e através deles.
Em segundo lugar, a espera é ativa. A maior parte de nós pensa que esperar é algo muito passivo, um estado de desespero determinado por eventos totalmente fora do nosso controle. O ônibus está atrasado? Não há nada a fazer; então você deve sentar e esperar. Não é difícil compreender a irritação das pessoas quando alguém diz: “Somente espere”. Tais palavras parecem levar-nos a uma atitude passiva.
Mas não há nada dessa passividade na Escritura. Os que estão esperando esperam muito ativamente. Eles sabem que o que esperam está crescendo no terreno onde estão esperando. Esse é o segredo: a fé de que a semente foi plantada, de que algo já começou. A espera ativa significa estar totalmente presente no momento, convencido de que algo está acontecendo onde você está e que você deseja fazer parte dessa realidade. Uma pessoa que espera é alguém que está presente, que acredita que este momento é o momento.
Uma pessoa que espera é uma pessoa paciente. A palavra “paciência” significa o desejo de ficar onde está e de viver a situação até as últimas conseqüências, na certeza de que algo escondido irá manifestar-se. As pessoas impacientes estão sempre esperando que a realidade aconteça num outro lugar e, por isso, estão inquietas para ir a outro lugar. O momento está vazio.
Esperar, portanto, não é uma atitude passiva, mas implica alimentar o momento presente como uma mãe alimenta uma criança que está crescendo no seu seio. Zacarias, Isabel, Maria, Simeão e Ana viveram o momento presente. Foi por isso que ouviram a voz do anjo. Estavam atentos à voz que lhes falou e disse a cada um: “Não tenha medo. Algo está para acontecer-lhe. Preste atenção”.
Mas há mais. Esperar é não ter certeza de onde se vai chegar. A espera incerta é difícil por termos a tendência de esperar por algo muito concreto, por algo que queremos possuir. Grande parte da nossa esperança é preenchida por desejos: “Gostaria de arranjar um emprego; gostaria que o tempo melhorasse; gostaria que esta dor passasse”. Estamos cheios de desejos e, então, a nossa esperança facilmente se perde no emaranhado desses desejos. Como conseqüência, muito da nossa esperança não admite incertezas. Pelo contrário, nossa esperança é uma maneira de querer controlar o futuro. Queremos que o futuro siga uma direção muito específica e, se isso não acontece, ficamos desapontados, podendo até cair no desespero. Eis por que temos tanta dificuldade em esperar. O que queremos é fazer aquilo que faça com que os acontecimentos desejados realizem-se. Então, podemos perceber como os desejos tendem a estar relacionados com o medo.
Mas Zacarias, Isabel, Maria, Simeão e Ana não estavam cheios de desejos. Eles estavam cheios de esperança. A esperança é algo muito diferente. A esperança é confiar que algo se realizará, mas se realizará em conformidade com as promessas e não simplesmente de acordo com os nossos desejos. Por isso, a espera é sempre incerta.
Imagine só o que Maria quis realmente dizer com as palavras: “Eis a escrava do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1.38). Ela quis dizer: “Eu não sei o que tudo isto significa, mas tenho a certeza de que algo de bom irá acontecer”. Ela confiou muito profundamente que a sua esperança estava aberta a todas as possibilidades. E ela acreditou que, ao escutar com atenção, podia confiar naquilo que iria acontecer.
Esperar estando aberto a todas as possibilidades é uma atitude extremamente radical perante a vida. É a certeza de que irá acontecer algo conosco que ultrapassa a nossa própria imaginação. É desistir de exercer o controle sobre o nosso futuro e deixar que Deus defina a nossa vida. É viver com a convicção de que Deus nos molda de acordo com o seu amor e não de acordo com o nosso próprio medo. A vida espiritual é uma vida em que esperamos vivendo ativamente o momento presente, esperando que coisas novas nos aconteçam; novas coisas que ultrapassam de longe as nossas expectativas e previsões. Essa é realmente uma tomada de posição radical perante a vida num mundo obcecado pelo controle.
A Prática da Espera
Deixem-me dizer, agora, alguma coisa sobre a prática da espera. Como esperamos? Esperamos juntos, com a Palavra de Deus no meio de nós.
Esperar é, acima de tudo, esperar juntos. Uma das mais belas passagens da Escritura está em Lucas 1.39-56, que nos fala da visita de Maria a Isabel. O que aconteceu quando Maria aceitou as palavras da promessa? Ela foi até Isabel. Algo estava acontecendo a Isabel assim como a Maria. Mas como é que conseguiram enfrentar essa realidade?
Acho o encontro dessas duas mulheres muito comovente, porque Isabel e Maria uniram-se e ajudaram uma a outra a esperar. A visita de Maria fez com que Isabel tomasse consciência daquilo que estava esperando. A criança saltou de alegria no seu seio. Maria confirmou a espera de Isabel.
E então Isabel disse a Maria: “Bem-aventurada aquela que acreditou, porque vai acontecer o que o Senhor lhe prometeu” (Lc 1.45). E Maria respondeu: “Minha alma proclama a grandeza do Senhor” (Lc. 1.46). Também ela ficou exultante. Essas duas mulheres criaram um espaço para cada uma poder esperar. Elas afirmaram uma para a outra que estava acontecendo algo pelo qual valia a pena esperar.
Aqui temos um modelo para a comunidade cristã: ela é uma comunidade de apoio, celebração e afirmação na qual podemos exaltar o que já começou em nós.
Esse é o significado da oração: encontrar-se em torno da promessa. Esse é o significado da celebração: pôr em evidência o que já lá está implícito.
Esse é o significado da eucaristia: dizer “obrigado” pela semente que já foi plantada. É dizer: “Estamos à espera do Senhor, que já veio”.
Todo o significado da comunidade cristã consiste em oferecer um ao outro um espaço em que esperamos pelo que já vimos. A comunidade cristã é o lugar onde mantemos a chama da esperança viva entre nós e levamos isso a sério, de modo que ela possa crescer e ser mais forte em nós.
Nesse caso, podemos viver com coragem, na certeza de que há um poder espiritual dentro de nós que nos permite viver neste mundo sem nos deixar abater constantemente pelo desespero. É assim que teremos a coragem de dizer que Deus é um Deus de amor mesmo quando à nossa volta vemos apenas rancor. É por isso que poderemos proclamar que Deus é um Deus de vida mesmo quando à nossa volta vemos morte, destruição e agonia. Dizemos isso juntos. Afirmamos isso uns para os outros. Esperar juntos, alimentar o que já começou, esperar pela sua completa realização, esse é o significado do matrimônio, da amizade, da comunidade e da vida cristã.
Em segundo lugar, a nossa espera é sempre modelada pela atenção ao mundo. Trata-se de esperar sabendo que alguém quer dirigir-se a nós. A questão é: nós estamos em casa? Estamos em nosso lugar preparados para atender a campainha? Precisamos esperar juntos para mantermos uns aos outros espiritualmente em casa, de maneira que, quando a Palavra chegar até nós, ela torne-se carne em nós. Eis o motivo por que o livro de Deus está sempre no meio dos que se reúnem: lemos a Palavra para que ela se torne carne e vida nova em nós.
Simone Weil, uma escritora de origem judaica, disse: “Esperar pacientemente, em expectativa, é a base da vida espiritual”. Quando Jesus fala do fim dos tempos, refere-se precisamente à importância da espera. Ele diz que nações combaterão contra nações e que haverá guerras e tremores de terra e desgraças. O povo agonizará e dirá: “Cristo está ali! Não, ele está aqui!” Muitos ficarão confusos e muitos serão enganados. Mas Jesus diz que você deve estar preparado, acordado, atento à Palavra de Deus, e então você vai sobreviver a tudo o que irá acontecer e poderá manter a confiança na presença de Deus na comunidade (cf. Mt 24).
É essa a atitude de espera que nos permite ser pessoas capazes de viver num mundo muito caótico e sobreviver espiritualmente.
Extraído do livro “O Caminho da Esperança” de Henri Nouwen.
Para pedidos ligue (19) 3462-9893
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“Entre Aspas”
“O silêncio é uma cela portátil que levamos conosco para onde quer que vamos.“