Andrew Murray
“Depois de terem comido, perguntou Jesus a Simão Pedro: Simão, filho de João, amas-me mais do que estes outros? Ele respondeu: Sim, Senhor, tu sabes que te amo. Ele lhe disse: Apascenta os meus cordeiros.” (Jo 21.15).
Pedro era um pescador. Após aquela primeira pesca milagrosa, o Senhor havia dito: “Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens” (Mt 4.19). O trabalho de Pedro na Terra era um símbolo de seu chamado celestial. Após a segunda pesca milagrosa, nos dias que antecediam a ascensão, nosso Senhor não chama mais Pedro de pescador, mas de pastor.
Há um significado profundo nessa mudança. Há uma grande diferença entre o pescador e o pastor; enquanto o primeiro não cuida dos peixes que pega nem os alimenta, buscando só os que atingiram o pleno crescimento e jogando os pequenos que caem na rede de volta para o mar, o pastor volta sua atenção aos jovens e frágeis, pois toda sua esperança depende do cuidado que dedica aos cordeiros.
A figura que o pescador representava não permitia ao Mestre dar a Pedro a incumbência especial de cuidar dos filhos da sua igreja. O chamado do pastor sugeria imediatamente as palavras Apascenta os meus cordeiros, e revela a profunda importância e a bendita recompensa de dar o primeiro lugar aos pequeninos do rebanho. O que Pedro (e os ministros de Cristo) deveriam fazer não era apenas alimentar as ovelhas – a prosperidade da igreja dependeria especialmente de alimentarem os cordeiros.
O que foi dito a eles é aplicável de uma forma bem especial aos pais como subpastores, que possuem seus próprios pequenos rebanhos para sustentar e criar para o Mestre. A comissão que Cristo deu à sua igreja através de Pedro mostra o lugar que os pequeninos têm em seu coração e ensina-nos a pensar na fragilidade, no valor, na necessidade e na esperança das nossas crianças.
Cordeiros dependentes
Apascenta os meus cordeiros, disse Jesus, o que nos lembra da fraqueza de nossos filhos e de sua vida religiosa. Certa vez, eu estava saindo de uma fazenda de ovelhas junto com o dono no início da noite. Havia nuvens ameaçadoras no céu; assim que saímos, ele correu de volta para chamar seu filho e gritar: “Cuide bem dos cordeiros! Uma tempestade está chegando”.
O Senhor estava prestes a subir ao trono; uma de suas últimas palavras foi: “Cuide dos cordeiros”. A ovelha é um animal frágil e indefeso; quanto mais um cordeirinho! Ele não consegue cuidar de si mesmo. O Mestre deseja que cada ministro e cada pai reflitam bastante sobre o quanto uma criança é totalmente dependente do cuidado daqueles a quem é confiada. Ela não sabe escolher a companhia certa para influenciá-la nem distinguir entre o bem e o mal. Não sabe nada sobre a importância de pequenas palavras ou ações, sobre formar hábitos, semear uma semente boa ou má e render-se ao mundo ou a Deus. Ela depende em tudo do que está à sua volta: os pais especialmente têm os filhos sob seu poder.
Que responsabilidade solene é guiá-los e nutri-los com cuidado, alimentá-los, não com as cascas vazias dos pensamentos e prazeres deste mundo, mas com a comida adequada, o leite para bebês que o nosso Pai providenciou, para guiá-los somente em pastos verdejantes!
Futuras ovelhas
Apascenta os meus cordeiros: as palavras nos fazem lembrar do alto valor dos pequeninos. Nos cordeiros, o pastor vê as possibilidades do futuro: como são os cordeiros, assim será o rebanho futuro. A igreja da próxima geração, os servos que Jesus terá de usar, daqui a apenas poucos anos, para converter, salvar e abençoar os homens, são as crianças de hoje. Quão pouco temos entendido e atendido a voz que diz: “Apascenta os cordeiros”.
Ele diz mais: “Apascenta os meus cordeiros” e também “deles é o reino” (Mt 19.14). Não apenas pelo que vão se tornar, mas pelo que já são em sua simplicidade e divindade infantis, ele os ama e lhes atribui grande valor. Pela lição que sempre ensinam a pessoas adultas, por toda a influência que exercem em tornar seus pais e anciãos mais gentis, humildes e verdadeiros, por todas as bênçãos que trazem àqueles que os recebem no nome de Jesus são de incalculável valor para ele, a parte mais bela do seu rebanho.
Procuremos captar o seu espírito quando ele clama: “Apascenta os meus cordeiros”. Oh, vamos aprender a enxergar nossos filhos sob a mesma luz que Jesus os enxerga! Oremos para que o Espírito Santo faça com que aquelas palavras familiares, cordeiros de Jesus, tornem-se uma profunda realidade para nós, até que nosso coração trema diante desse pensamento. Nossos pequeninos são seus cordeiros: devemos alimentá-los diariamente como tais, para que cresçam como ovelhas do seu pasto.
Nutrição espiritual
Apascenta os meus cordeiros: a grande necessidade das crianças é colocada diante nós. O alimento é a condição para o crescimento. Deve ser recebido de fora para ser assimilado e absorvido em sua própria vida. O corpo obtém seu alimento a partir do mundo visível. A mente é nutrida por pensamentos que nela penetram. O espírito se alimenta, por intermédio da mente, dos pensamentos e palavras de Deus.
Os pequeninos não podem buscar pasto para si sozinhos; Cristo confia aos pais a tarefa de levar a eles dia a dia, não apenas um capítulo da Bíblia, na maioria dos casos muito além da sua compreensão, mas alguns pensamentos de sabedoria e amor divinos, sem os quais a alma não terá condições de crescer. Não menos cuidadosamente que uma mãe que se preocupa diariamente com o que dará ao filho para comer, eles devem dia a dia alimentar espiritualmente cada cordeiro confiado aos seus cuidados. O único desejo e objetivo deve ser o de criá-lo para o Senhor. A consagração de uma criança para Deus deve ser a missão principal em sua vida. O desejo consumidor de cuidar do filho, de prepará-lo para pertencer a Jesus, completamente e apenas a ele, tornará essa tarefa fácil.
Amor por Jesus
Apascenta os meus cordeiros: as palavras falam da provisão que Cristo fez em favor dos necessitados (fracos). Para quem essas palavras foram ditas? Para aquele a quem a seguinte pergunta havia sido feita: “Tu me amas?” e que respondeu: “Sim, Senhor, tu sabes que te amo”. Somente alguém que é inspirado pelo amor por Jesus pode realmente tomar conta dos seus cordeiros. Esse é o exame de aptidão para o cargo de pai e pastor dos cordeiros: “Tu me amas?” Essa é a provisão que Jesus fez para os cordeiros: o verdadeiro amor por Jesus consegue realizar o trabalho.
Que cada pai (e mãe) que deseja saber como obter a qualificação necessária para esse trabalho deixe seu nome para passar por esse exame. Que Jesus sonde o seu coração – uma, duas, três vezes – até que a lembrança de atos de infidelidade no passado traga lágrimas aos olhos, e a resposta venha: “Senhor, tu sabes todas as coisas, tu sabes que te amo”.
Infelizmente, é isso que mancha tantos lares cristãos – o amor por Jesus de maneira consciente, fervorosa e confessa está faltando. Nada influencia mais uma criança do que o amor: o calor do santo amor por Jesus sempre a impactará. Pode haver muita religião, ensino e oração, mas somente o amor conquistará.
O amor por Jesus nos levará a obedecê-lo com muito cuidado, a andar bem próximo a ele, a confiar nele com muita sinceridade. O amor por Jesus fará com que o desejo de agradá-lo se torne mais forte, e a incumbência que ele nos dá, mais preciosa. O amor por Jesus fará com que nosso testemunho dele seja mais pessoal. O alimento que damos aos cordeiros terá o calor do amor divino embutido em si mesmo. Jesus quer pais que o amem, que o amem com todo o seu coração e toda sua força: essa é a provisão que ele planejou para os seus cordeirinhos.
A religião de Jesus é a religião do amor. Sobre o Pai, a Bíblia diz que: “Deus é amor” (1 Jo 4.8). O próprio Jesus é o presente de um amor que ultrapassa o conhecimento. Sua vida e obra são de amor, um amor mais forte que a morte. Quando o Espírito Santo vem até nós, ele derrama em nossos corações o amor de Deus. Toda a nossa relação com a divindade deve ser caracterizada por amor. E nossa relação entre pais e filhos foi planejada para ser produzida pelo amor.
Foi para restaurar isso que Jesus veio. E ele o faz convocando os pais a amá-lo e, depois, a receber os pequeninos em seu nome, por sua causa e no fervor do seu amor, para cuidar deles. Ele purifica e eleva o amor terreno por meio do amor celestial. E o lar é consagrado pela luz do amor de Jesus que repousa sobre os filhos, pelo poder do seu amor habitando nos pais e por fazer do trabalho de educação de filhos uma obra de amor para ele.
Um bendito chamado
Pais cristãos, vejam e aceitem seu bendito chamado; vocês são pastores do amor divino responsáveis por guardar e alimentar os cordeiros. Na sua igreja, o Pastor Principal tem muitos pastores que cuidam do rebanho, mas nenhum que possa cuidar tão bem dos cordeiros quanto os pais. “E lhe prospera famílias como rebanhos” (Sl 107.41); é no amor paterno e materno, inspirado e santificado pelo amor redentor, que Jesus procura recursos para edificar sua igreja. Oremos insistentemente para que, em primeiro lugar, nossos olhos sejam abertos para ver como Jesus vê, para perceber através do Espírito Santo o que ele sente pelos pequeninos, o que espera de nós e o que está pronto para fazer por nós, dando-nos sabedoria e força.
Apascenta os meus cordeiros: quando essas palavras se tornam o alicerce de todo o dever dos pais, que ternura e amor inspirarão, que paz celestial, que cuidado atento e fiel e que vida incessante de fé no amor, na graça e na bênção de Jesus em nosso lar! Esperemos sempre pela voz que nos diz: “Tu me amas? Apascenta os meus cordeiros”.
Bendito Salvador, tu és o bom Pastor, sobre quem minha alma disse: “O Senhor é meu Pastor, nada me faltará”. Eu te bendigo pelo terno amor que não desprezou os pequeninos, mas os entregou tão carinhosamente aos cuidados de teu servo Pedro, ao instituí-lo como pastor, em teu precioso “Apascenta os meus cordeiros”. Eu te bendigo pelo santo privilégio que o Senhor concedeu a mim de ser pai (ou mãe), e também de poder desempenhar tua comissão: “Apascenta os meus cordeiros”. Eu te bendigo com todo o meu coração pela honra e bênção de ser, em minha pequena esfera, o que tu és na tua, de ser aos outros o que és para mim, um pastor amoroso e gentil. Oh, meu Senhor, que minha experiência diária do teu cuidado e amor pastoral por mim seja uma lição contínua para ensinar-me como devo alimentar meu pequeno rebanho de cordeiros.
Bendito Mestre, como servo do teu amor aos meus filhos, rogo que abras meus olhos para enxergar meus filhos como tu os vês, a considerá-los sempre e somente à luz de que são teus. Abre meus olhos para ver como necessito de uma vida santa de comunhão contigo, de separação do mundo e do espírito que nele opera, de vigilância e confiança para cumprir com o meu dever a ti e aos teus cordeiros. Leva embora todo pensamento de relutância e medo da dificuldade e do fardo, e deixa-me ver o quanto uma vida simples, como a de uma criança, é melhor, e o único treinamento verdadeiro para realizar o trabalho de um pai ou de uma mãe corretamente.
E para isso, enche-me com teu amor. Confesso, com vergonha, que tenho tido tão pouco desse amor entusiasmado por ti. Senhor, perdoa-me e livra-me disso. Que o amor por ti, um amor radiante e obediente, seja a atmosfera do lar no qual meus filhos vão crescer. Oh, tu que és o próprio Cordeiro de Deus, que permitiste que meus filhos tivessem o mesmo nome que tu tens, sendo também cordeiros de Deus; oh, que o teu santo amor em meu coração seja o poder que inspira toda a minha relação contigo e com eles. E que assim eu possa provar como tu és um pastor maravilhoso para mim, e o quanto sou abençoado por ser o pastor deles.
Por amor do teu nome. Amém.
Respostas de 9
Parabéns! Muito lindo, me edificou bastante.
Bom discernimento. Assisti uma pregação em que o pregador chama de cordeiros os novos convertidos.
Não vejo muita lógica pois tem muitas ovelhas se “descovertendo”. Todos precisam de cuidados até Jesus voltar.
Faz mais sentido em relação aos jovens e crianças. Um jovem que não conheceu o mundo, novo convertido é diferente de um adulto novo convertido. Todos precisamos de cuidados. Mas as crianças muito mais.
Deus te abençoe, e te de a PAZ.
A paz do Senhor! Que tarefa linda Jesus deixou para todos nós que somos pais, com isso aprendi bastante que pra termos grandes pastores é necessário apresentar primeiro nossos cordeiros com um amor único e verdadeiro do mesmo jeito que Jesus nos ensinou.
Cordeiros também são menos favorecidos, os que não tem ninguém por si, os pobres os presidiários, os velhinhos os enfermos.
Um bom texto para se meditar.
Maravilhoso ??
Fui impactado por esse texto, me fez lembrar de algo que aconteceu em um lugar que trabalhei, lá tínhamos um rebanho de ovelhas e, em certa ocasião, uma ovelha, após dar cria, recusou um dos filhotes.
O capataz veio me perguntar o que fazer com o filhote, então pedi a ele que o trouxesse à minha casa e o tratamos com mamadeira até que se tornasse independente, e então o soltamos junto com e rebanho.
Por algum tempo ele vinha em uma parte da cerca que ficava a uns trinta metros da nossa casa e ficava berrando, aí tínhamos que levar nosso filho de três anos para trocar carinhos com o cordeirinho que tinha o nome de Pansinha, até que ele se acostumou com o rebanho.
Entendi, só agora, que isso era algo profético para nós, depois de pouco tempo nos convertemos ao Senhor Jesus, e tivemos um trabalho em nossa casa: aos sábados recebíamos crianças – muitas delas muito carentes, aqui eles recebiam lanches para o físico e espírito.
Só entendi isso hoje ao terminar de ler o evangelho de João e, eu e minha esposa nos deparamos com a diferença das palavras cordeiros e ovelhas, daí encontramos esse texto e enquanto lia o Senhor foi me trazendo tudo à mente fui abraçado por Ele. Deus abençoe.
Estou fazendo um trabalho para o ministério infantil (M.I) da minha igreja e esse artigo me ajudou muito.
Muito rico, e veio com o que eu já falo sobre essa passagem, infelizmente, alguns líderes não se atentam para isso, não levam o M.I com crianças a sério.
Uau, muito emocionante e reflexivo!
Parabéns ao escritor 👏🏽