8 de novembro de 2024

Ler é sagrado!

Aquietai-vos

Por: Harold Walker

“Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus…” (Sl 46.10).
“Mas o Senhor está no seu santo templo; cale-se diante dele toda a terra” (Hc 2.20).
“Cale-se, toda a carne, diante do Senhor; porque ele se levantou da sua santa morada” (Zc 2.13).

Por natureza somos irrequietos e agitados, mas em momentos de crise ou tensão esta inquietação aumenta. Sentimo-nos obrigados a tomar decisões, procurar soluções e planejar estratégias. Se não sabemos o que fazer ficamos andando em círculos procurando uma saída, ou falamos sem parar para expressar nossa preocupação e frustração.

Neste início de século, todos — tanto cristãos como não-cristãos — sabem que o planeta Terra e todos os seus habitantes, onde quer que se encontrem, passarão por dias turbulentos, inseguros e imprevisíveis. De fato, as palavras de Jesus em Lucas 21.25,26 — descrevendo a situação da humanidade nos últimos dias — começam a fazer sentido: “…e sobre a terra haverá angústia das nações em perplexidade pelo bramido do mar e das ondas; os homens desfalecerão de terror, e pela expectação das coisas que sobrevirão ao mundo…”.

Como cristãos, além das notícias diárias, contamos com as profecias claras das Escrituras. Elas mostram que, antes de melhorar (com a vinda do reino de Deus), as coisas vão piorar (e muito!): as trevas cobrirão a terra e haverá pragas, guerras, fome, terror e tribulação.

Diante de tal situação, mais do que nunca se torna necessário entendermos o que Deus espera de nós como seu povo na terra, nesta geração. Grande responsabilidade pesa sobre nós para desempenharmos fielmente nosso papel no plano cósmico de Deus. Somos como os atletas da última etapa de uma corrida de revezamento, de quem depende o sucesso de todos os atletas das etapas anteriores.

Portanto, passaremos dias de tensão sem precedentes, com tendência a se agravar cada vez mais. Em tais situações, como mencionado anteriormente, nossa inquietação e agitação naturais tendem a aumentar grandemente. Mas as instruções de Deus para nós são totalmente contrárias a esta tendência natural. Ao invés de exigir muito esforço e ativismo, Deus ordena que fiquemos quietos! Ao invés de conclamar-nos à batalha, ele manda aquietarmo-nos! Ao invés de pedir que todas as sirenes de emergência sejam ligadas, ele pede que nos retiremos de todo barulho e distração e nos recolhamos a um lugar silencioso de oração e adoração! Por quê?

Em primeiro lugar, precisamos entender, uma vez por todas, que Deus não criou o homem para ser um escravo ou empregado que executa suas ordens. Para isto ele tem miríades de anjos que o fazem muito melhor do que nós. O propósito de Deus para o homem é que este administre a execução dos seus planos na terra em comunhão com ele, sendo de fato sua imagem e representação para o resto da criação. Portanto, a função primordial e prioritária do homem é ouvir, não fazer. Assim como Deus determinou que o homem fosse a chave para toda a criação e que nada acontecesse sem sua participação e permissão, da mesma forma ele nunca pensou que o homem devesse fazer qualquer coisa, por pequena que fosse, sem ele. A criação é o projeto dos dois e nada pode ser feito nela que não seja originado por Deus e compartilhado com o homem.

O Homem Não Gosta de Ouvir

O grande problema de Deus com o homem é que este não quer ouvir. O que o homem tem de pressa para agir, falta-lhe em paciência para ouvir. Confira a seguir algumas passagens que mostram este problema milenar do homem:

“…Se ainda mais ouvirmos a voz do Senhor nosso Deus, morreremos… Chega-te tu, e ouve tudo o que o Senhor nosso Deus falar; e tu nos dirás tudo o que ele te disser; assim o ouviremos e cumpriremos” (Dt 5.25,27). Israel não queria ouvir Deus; queria que Moisés o ouvisse e que eles apenas cumprissem as ordens, por ser, na avaliação deles, a parte mais fácil!

“Ouve-me, povo meu, e eu te admoestarei; ó Israel, se me escutasses!… Mas o meu povo não ouviu a minha voz, e Israel não me quis… Oxalá me escutasse o meu povo! Oxalá Israel andasse nos meus caminhos!” (Sl 81.8,11,13).

“Ah! Se tivesses dado ouvidos aos meus mandamentos! Então seria a tua paz como um rio, e a tua justiça como as ondas do mar” (Is 48.18).

“Por que gastais o dinheiro naquilo que não é pão? E o produto do vosso trabalho naquilo que não pode satisfazer? Ouvi-me atentamente, e comei o que é bom… Inclinai os vossos ouvidos, e vinde a mim; ouvi, e a vossa alma viverá; porque convosco farei um pacto perpétuo” (Is 55.2,3).

“Tinha esta uma irmã chamada Maria, a qual, sentando-se aos pés do Senhor, ouvia a sua palavra. Marta, porém, andava preocupada com muito serviço…” (Lc 10.39,40).

“Logo a fé é pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Cristo” (Rm 10.17).

“Pelo que, como diz o Espírito Santo: Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações, como na provocação” (Hb 3.7,8).
“Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas” (Ap 2.7).

Por Que o Homem Não Gosta de Ouvir?

Por que o homem tem tanta dificuldade em ouvir a Deus? Existem vários motivos mas queremos ressaltar os dois principais:

1 – Auto confiança.
O homem confia tanto em si mesmo que não sente necessidade de ouvir de Deus. O máximo que sente é a necessidade de Deus abençoar e fazer prosperar seus próprios projetos e planos.

2 – Barulho.
O homem está cercado por tantas vozes interiores e exteriores que tem dificuldade em ouvir a voz de Deus. Para fugir da confusão produzida por estas vozes conflitantes o homem mergulha nas atividades profissionais, no lazer, nos vícios ou nos programas religiosos. De toda forma possível, procura um meio de escape das questões insolúveis da vida, às vezes evitando-as e outras vezes aceitando respostas fáceis. Em ambos os casos, as questões permanecem sem solução e acabam aparecendo novamente, causando caos em sua vida. Isto porque a única coisa que pode resolvê-las é ouvir a voz de Deus.

Voltemos, então, ao nosso pensamento inicial: À medida em que as tensões aumentam no mundo e o fim de todas as coisas se aproxima, Deus ordena — e cada vez com mais intensidade e urgência — que nos aquietemos. Por quê? Durante a história o plano de Deus na terra tem passado por épocas de dormência quando Deus aparentemente não estava falando ou fazendo nada. Nestas épocas Deus permite que os homens se enganem pensando que estão controlando as coisas tanto secular quanto religiosamente.

Mas em outras ocasiões, Deus se levanta com zelo e furor e começa a fazer tremer todas as estruturas humanas. É nestas épocas que ele manda o homem se aquietar. É como se ele estivesse dizendo: “Vocês já brincaram bastante. Saiam do meu caminho, porque agora eu vou agir!” Isto é verdade em relação ao ativismo humano e a todas as respostas prontas da sabedoria humana. Por outro lado, em relação à função do seu povo na terra, é como se ele estivesse dizendo: “Façam calar todas as outras vozes, suas próprias opiniões e as opiniões dos outros. Tenho algo muito importante para falar e fazer no mundo e depende da minha comunhão com vocês. Se eu não ganhar sua atenção irrestrita, não poderei falar.

Calem-se! Aquietem-se! Desistam de todos seus próprios planos, idéias e soluções e preparem-se para me ouvir!”.

A Importância do Deserto

Não é por acaso que Deus leva muitos dos seus filhos para o deserto para poder falar com eles. No deserto, longe do barulho e movimento da cidade, é mais fácil ouvir a voz de Deus porque é mais fácil dar a atenção irrestrita a Deus que isto requer. Moisés só encontrou com Deus depois de uma dose cavalar de deserto: 40 anos, calando todas as ambições e idéias da alma (Êx 3.1-6). Depois deste encontro com Deus sua tarefa era ir ao Egito e trazer todo o povo de Israel a este mesmo lugar para encontrar-se com Deus (Êx 3.12; 19.1,2,17).

Quando Elias entrou em crise e precisava ouvir de Deus, para onde será que ele foi? Ao deserto! (1 Rs 19.3,4,8). Depois do cativeiro de Israel quando Deus começou a falar sobre a restauração do seu povo, será que os guiaria direto da Babilônia para Jerusalém? Não. Primeiro ele disse que levaria seu povo ao deserto para falar com eles ali (Os 2.14; Ez 20.35-38). Depois de 400 anos de silêncio, onde foi que a palavra do Senhor voltou a ser ouvida por um homem? No deserto, por João Batista! (Lc 1.80; 3.2). O próprio Filho de Deus encarnado, Jesus, sentia necessidade freqüente de se retirar do meio do povo para ficar em lugares desertos para ter comunhão íntima com seu Pai (Lc 5.16; 6.12; Mc 1.35,36). E finalmente, no último livro da Bíblia vemos que o único lugar de sustento e proteção para a igreja gloriosa será o deserto (Ap 12.6,14).

Nossa cultura moderna tem-nos condicionado ao ativismo e acabamos aplicando esse modo de ser também à nossa vida espiritual. Achamos que para ouvir de Deus temos de fazer algo: orar muito, jejuar e nos santificar. O problema é que ficamos tão envolvidos em nossas atividades para “buscar” a Deus que fica impossível achá-lo! Valorizamos tanto o processo da busca que perdemos a visão do objetivo. Fazia muito tempo que Deus queria falar com seu povo e ele tinha urgência, mas isto não o impediu de fazer Moisés esperar 6 dias inteiros no Monte Sinai antes de começar a falar com ele (Êx 24.15,16). Ouvir a Deus gasta tempo e atenção total. A alma tem que se calar. As preocupações de Moisés com o povo e consigo mesmo tinham de desaparecer e um silêncio total invadir seu ser para que a voz de Deus pudesse ser ouvida com clareza e pureza.

Todos os problemas de Saul começaram quando ele não teve paciência para esperar por Samuel para trazer-lhe as próximas instruções de Deus (1 Sm 13.8-14). Deus não vai ser encontrado por nós na hora em que nós queremos mas na hora em que ele quer e isto significa que precisaremos esperar paciente e persistentemente por ele.

Um homem de Deus do início do século XX, G. C. Bevington, experimentou tremendos encontros com Deus e maravilhosas respostas de oração através de praticar este princípio de esperar em Deus (veja página 19). Ele dizia que era necessário ficar absolutamente quieto em todo sentido diante de Deus e que isto normalmente lhe tomava vários dias e noites, ininterruptos, e quase sempre em jejum. No fim, em poucos minutos Deus falava tudo que ele precisava saber, mas gastava muito tempo para alcançar estes preciosos momentos.

Outro ponto importante é que quando Deus chega para falar, ele não gosta de ser interrompido. Às vezes, o homem é tão cheio de si que não percebe a majestade de Deus e afugenta a arisca pomba do Espírito. No monte da transfiguração, Pedro, ao invés de ficar mudo em reverência e assombro diante da visão da glória de Jesus e o aparecimento de Moisés e Elias, com as melhores intenções começou a falar bobagens (Lc 9.32,33). Deus, porém, logo cortou suas palavras insensatas e fê-lo sentir temor ao envolvê-lo com a nuvem da sua presença e expressar-se em voz audível (Lc 9.34-36).

Salomão, o homem mais sábio da terra, referiu-se a este assunto quando disse: “Guarda o teu pé, quando fores à casa de Deus; porque chegar-se para ouvir é melhor do que oferecer sacrifícios de tolos… Não te precipites com a tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra alguma na presença de Deus… Porque da multidão de trabalhos vêm os sonhos, e da multidão de palavras, a voz do tolo” (Ec 5.1-3).

Conclusão

Na prática, nada vai mudar em nossas vidas até que sintamos a urgência de ouvir a voz de Deus e a futilidade de todas as nossas atividades seculares e religiosas que não estão baseadas nisto. Quando ficamos convictos disto, precisamos começar a separar tempo e espaço para Deus cada dia, e à medida que nosso interior se aquieta, sintonizar-nos com a voz de Deus. Com certeza, as palavras que ouvirmos da sua boca nos levarão a decisões práticas e radicais que mudarão o nosso estilo de vida, liberando nossa alma de tantas atrações e desejos fúteis, e criando muito mais tempo e espaço para o diálogo com Deus. É neste espaço livre e vazio, criado no interior de uma pessoa que não quer mais nada a não ser Deus, que o Espírito Santo começará a agir e coordenar as últimas etapas do seu plano para o homem na terra.

Podemos ver no livro do Apocalipse que os grandes acontecimentos do fim não serão executados pelo homem mas pelos anjos. A nossa parte como igreja, como povo do Senhor vivendo na terra, é entrar no santíssimo lugar em adoração e comunhão com Deus, e isto vai liberar os anjos para executar os juízos de Deus sobre a terra e preparar o caminho para a vinda do reino de Deus.

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