Por D. L. Moody
“Os que forem sábios, pois, resplandecerão, como o fulgor do firmamento; e os que a muitos conduzirem à justiça, como as estrelas, sempre e eternamente” (Dn 12.3).
O testemunho acima foi dado por um homem idoso que havia vivenciado experiências mais ricas e profundas do que qualquer outro ser humano da época. Ele foi deportado para a Babilônia ainda bem jovem; alguns estudiosos da Bíblia acreditam que não tinha mais do que vinte anos de idade. Se alguém tivesse dito no momento em que esse jovem hebreu foi levado para o cativeiro que chegaria a sobrepujar todos os homens poderosos da sua geração – provavelmente ninguém teria dado crédito algum. Entretanto, durante os quinhentos anos seguintes, ninguém, cuja vida tenha sido registrada pela história, brilhou tanto quanto este homem – Daniel. Ele ofuscou Nabucodonosor, Belsazar, Ciro, Dario e todos os príncipes e monarcas poderosos da sua época.
Hoje em dia, ouvimos as pessoas se queixarem das dificuldades em seu campo de atividade; costumam dizer que a situação em que se encontram é muito peculiar. Pense um pouco no ambiente onde Daniel tinha que trabalhar. Além de escravo, ele era mantido em cativeiro por uma nação que detestava os hebreus. A língua lhe era desconhecida e estava inserido no meio de pessoas pagãs e idólatras. Mesmo assim, logo no início, já começou a brilhar. Desde o princípio, tomou posição ao lado de Deus e assim continuou pelo resto de sua vida. Ele deu as primícias de sua juventude para Deus e assim permaneceu fiel até o final de sua peregrinação.
Observe que todos aqueles que deixaram uma impressão profunda no mundo e resplandeceram com mais intensidade foram pessoas que viveram em tempos escuros. Veja o caso de José: foi vendido pelos ismaelitas como escravo para o Egito, contudo levou o seu Deus consigo para o cativeiro, assim como Daniel faria muito tempo depois. E permaneceu fiel até o fim; não desistiu da fé por ter sido arrancado do lar e levado para um ambiente pagão. Permaneceu firme, e Deus o defendeu.
Olhe para Moisés que deu as costas para os magníficos palácios do Egito e se identificou com seu povo desprezado e maltratado. Se alguém já teve um desafio dificílimo para enfrentar, esse alguém foi Moisés; contudo, brilhou maravilhosamente e nunca foi infiel ao seu Deus.
Elias viveu numa época muito mais escura que a nossa. Toda a nação estava abandonando Deus e indo atrás de Baal. Acabe, sua rainha e toda a corte real estavam usando toda a influência que possuíam contra o culto ao Deus verdadeiro. Entretanto, Elias permaneceu firme e brilhou com grande fulgor naquela época tão escura e perversa. Como o seu nome se destaca nas páginas da história!
Veja, também, João Batista. Houve uma época em que eu pensava que preferiria viver nos dias dos profetas, mas já desisti dessa ideia. Você pode ter certeza de que quando um profeta aparece, é porque tudo escureceu, e os que representam oficialmente o povo de Deus já se entregaram para servir ao príncipe deste mundo. Foi assim quando João Batista surgiu na história. Veja como o nome dele brilha agora! Dezoito séculos já se passaram [quando este artigo foi escrito], mas a fama daquele pregador do deserto resplandece com mais intensidade do que nunca. Ele foi desprezado na sua época e na sua geração, contudo, sobreviveu a todos os inimigos. Seu nome será sempre respeitado, e a sua obra será lembrada enquanto existir a Igreja nesta terra.
Você acha que seu campo de trabalho é difícil! Veja como Paulo brilhou por Deus, desde sua primeira viagem missionária para os gentios, falando-lhes sobre o Deus a quem servia, que tinha enviado o Filho para sofrer uma morte cruel a fim de salvar o mundo. Os homens o odiaram e rejeitaram os seus ensinamentos; riam-se e zombavam dele quando lhes falava a respeito do crucificado. Entretanto, ele continuou pregando o evangelho do Filho de Deus. Era considerado um pobre fabricante de tendas pelos grandes e poderosos da época; hoje, porém, ninguém se lembra do nome de qualquer um de seus perseguidores ou contemporâneos – a não ser que seus nomes sejam associados ao dele ou que tenham tido alguma relação com ele.
Vivendo para Deus
Não está escrito em Daniel 12.3 que os estadistas iriam brilhar como o esplendor do firmamento. Os estadistas da Babilônia já se foram; até os seus nomes caíram no esquecimento.
Também não diz que a nobreza iria brilhar. A nobreza terrena é logo esquecida. João Bunyan, o funileiro de Bedford [autor da obra clássica O Peregrino], sobreviveu a toda a multidão de nobres da sua época. Enquanto eles viveram para si mesmos e até a sua memória já foi apagada, Bunyan viveu para Deus e para os outros, e o seu nome continua sendo uma fragrância agradável, como sempre foi.
Também não nos foi dito que os empresários iriam brilhar. Quem é capaz de mencionar o nome de sequer um dos milionários da época de Daniel? Todos eles foram sepultados no esquecimento poucos anos após a sua morte. Quem eram os grandes conquistadores daqueles dias? Poucos podem mencionar. É verdade que ouvimos falar de Nabucodonosor, mas provavelmente pouco saberíamos a respeito dele se não tivesse uma história relacionada com a do profeta Daniel.
Quão diferente é a história desse fiel profeta do Senhor! Já se passaram 25 séculos, e o seu nome continua reluzente como sempre, brilhando com fulgor cada vez mais intenso. E vai continuar a resplandecer enquanto existir a Igreja de Deus. “Os que forem sábios, pois, resplandecerão, como o fulgor do firmamento; e os que a muitos conduzirem à justiça, como as estrelas, sempre e eternamente” (Dn 12.3).
Como são vazios e efêmeros a glória e o orgulho deste mundo! Se formos sábios, viveremos para Deus e a eternidade; deixaremos de viver para nós e não daremos valor algum à honra e à glória deste século. Lemos em Provérbios 11.30: “Aquele que ganha almas é sábio”. Qualquer homem, mulher ou criança que ganhar, por meio do testemunho de uma vida santa, uma única vida para Deus, não terá vivido em vão. Sobrepujarão em glória todos os personagens importantes e famosos da sua época, porque colocaram em movimento um rio que correrá para todo o sempre.
Chamado para brilhar
Deus nos deixou aqui neste mundo para brilhar. Não estamos aqui para comprar, vender e obter lucro, para acumular riqueza, para adquirir posição ou glória. Este sistema atual não é o ambiente próprio para nós cristãos; nascemos para fazer parte do reino de Deus. Deus nos enviou ao mundo para brilhar para ele – para iluminar este mundo em trevas. Antes de Cristo ascender ao alto, ele disse com efeito aos seus discípulos: “Vocês são a luz do mundo. São minhas testemunhas. Saiam e levem o Evangelho às nações, às multidões que estão morrendo”.
Portanto, Deus nos chamou para resplandecer, assim como Daniel foi enviado à Babilônia para brilhar. Que nenhum homem ou mulher diga que não consegue brilhar porque não tem a mesma influência que alguns outros possuem. O que Deus quer de você é que use a influência que tem. No princípio, Daniel provavelmente não tinha muita influência no cativeiro, mas Deus logo lhe deu mais porque ele foi fiel e usou o pouco que tinha.
Lembre-se de que mesmo uma pequena luzinha faz uma grande diferença quando está num lugar muito escuro. Ponha uma velinha no meio de um grande salão, e ela iluminará uma boa área.
Precisamos lembrar, também, que devemos deixar a nossa luz brilhar. O texto não diz: “Faça a sua luz brilhar”. Você não precisa fazer a luz brilhar; tudo o que tem de fazer é deixá-la brilhar.
Lembro-me da história de um homem que viajava num navio e se sentiu mal por causa de enjoo. Enquanto passava mal, ele ouviu que alguém tinha caído no mar. Logo, se perguntou se havia algo que pudesse fazer para ajudar a salvar aquele homem. Achou uma lanterna e levantou-a até a escotilha do navio. O homem que se afogava foi salvo.
Quando o homem doente melhorou, foi até o convés e começou a conversar com o indivíduo que fora resgatado. O homem salvo lhe deu este testemunho: contou que já tinha afundado pela segunda vez e estava quase submergindo pela terceira e última vez, quando levantou a sua mão. Exatamente naquele momento, segundo relatou, alguém levantou uma lanterna numa escotilha, e a luz caiu sobre ele. Um marinheiro o viu, agarrou-o pela mão e o trouxe para o barco salva-vidas.
Parecia uma coisa muito insignificante segurar uma lanterna; contudo, foi o que salvou a vida daquele homem. Se você não puder fazer algo grande, com certeza conseguirá segurar a lanterna para uma vida em perigo a fim de que seja ganha para Cristo e liberta da destruição. Tomemos a tocha da salvação e a levemos aos lares escuros; levantemos Cristo às pessoas como o Salvador do mundo.
Se quisermos alcançar as multidões que estão morrendo, precisaremos colocar a nossa vida ao lado delas, orar com elas e empenhar-nos em favor delas. Não posso dar muito crédito ao cristianismo de um homem que se diz nascido de novo, mas não tem o desejo de levar a salvação a outros. Parece-me o cúmulo da ingratidão se não estendermos a mão para aqueles que estão no fundo do mesmo poço de onde nós mesmos fomos libertados. Quem seria mais capaz de alcançar e ajudar aqueles que não conseguem abandonar o álcool do que quem já esteve sob o mesmo jugo opressor? Você não se disporia a sair hoje mesmo para buscar e salvar tais pessoas? Se todos nós fizéssemos o que está ao nosso alcance, logo esvaziaríamos os bares e demais ambientes de vício e pecado.
Não seja pedra de tropeço
Havia um cego sentado numa esquina de uma cidade grande com uma lanterna acesa ao seu lado. Alguém se aproximou dele e lhe perguntou por que tinha uma lanterna acesa, já que era cego e tanto a luz como a escuridão eram a mesma coisa para ele. O cego respondeu: “Eu a coloquei do meu lado para que ninguém tropece em mim”.
Queridos amigos, pensemos nisso. Enquanto um homem lê a Bíblia, pelo menos cem leem a minha vida e a sua. Isso é o que Paulo quis transmitir quando disse que deveríamos ser cartas vivas de Cristo, conhecidas e lidas por todos os homens. Não acredito que muita coisa de valor possa ser feita por sermões, se não pregarmos Cristo por meio da nossa vida. Se não despertarmos interesse nas pessoas pelo Evangelho com a santidade do nosso comportamento e das nossas palavras, nunca as ganharemos para Cristo. Um pequeno ato de bondade talvez contribua mais para influenciá-las do que uma porção de longos sermões ou apresentações evangelísticas.
Mantenha as luzes baixas[1] acesas
Vamos manter as nossas luzes no lugar certo, de tal modo que o mundo possa ver que a vida de Cristo não é uma impostura e, sim, uma realidade. Conta-se que nos esportes gregos da antiguidade havia uma prova em que os atletas corriam com luzes. Acendiam uma tocha no altar e corriam certa distância, sendo que algumas vezes era a cavalo. Se o atleta chegasse à linha de chegada com a tocha ainda acesa, ele recebia o prêmio; se estivesse apagada, perdia.
Quantas pessoas, ao chegarem à idade mais avançada, já perderam a luz e a alegria! Em tempos passados, suas tochas ardiam com chamas intensas na família, na Escola Dominical e na igreja. Ao longo dos anos, porém, algo surgiu entre eles e Deus – uma atração ou influência do mundo ou um desejo pessoal – e a luz foi se apagando.
Leitor, se algo semelhante aconteceu com você, que Deus o ajude a voltar para o altar do amor do Salvador e acender de novo a sua tocha, de tal modo que possa sair pelos caminhos e pelos becos do mundo e deixar que a luz do Evangelho brilhe em lares onde reina escuridão.
Influência duradoura e de longo alcance
Se levarmos uma única pessoa a Jesus Cristo, podemos iniciar uma corrente viva que continuará em movimento mesmo quando não estivermos mais por aqui. É como uma pequena nascente lá no alto, na encosta de uma montanha: é tão fraquinha que um boi seria capaz de secá-la em um minuto. Pouco a pouco, porém, o filete de água se torna um pequeno riacho; logo, outros riachos desembocam nele. Aos poucos, transforma-se num ribeiro e, depois, num grande rio que corre em direção ao mar. Às suas margens, florescem cidades, vilas e vilarejos, onde vivem milhares de pessoas. A vegetação cresce com vigor nos dois lados, e mercadorias são transportadas para terras distantes no seu bojo majestoso.
Por isso, se você levar uma só pessoa para Cristo, ela pode se multiplicar em cem, e as cem em mil, de maneira que a corrente, a princípio tão minúscula, vai se alargando e se aprofundando à medida que corre em direção à eternidade.
Muitos daqueles que são mencionados nas Escrituras só deixaram o registro de que viveram por tantos anos e depois morreram. O berço e a sepultura foram deixados lado a lado: simplesmente viveram e morreram, e isso é tudo o que sabemos deles. Hoje, também, poderíamos escrever na lápide da grande maioria dos cristãos que nasceram em tal dia e morreram em tal dia; não houve nada digno de ser mencionado entre as duas datas.
Existe uma coisa, porém, que não pode ser enterrada com um homem bom: a sua influência, que continuará impactando depois de sua morte. Ainda não conseguiram sepultar a influência de Daniel; continua tão forte quanto o era no final de sua vida (ou ainda mais!). Você acha que José está morto? A sua influência ainda vive e continuará a viver. Você pode enterrar o frágil corpo de barro em que viveu um homem bom, mas não conseguirá se livrar de sua influência e exemplo. Paulo nunca foi tão poderoso quanto o é hoje.
Você afirma que John Howard, que visitou muitas das mais tenebrosas prisões da Europa, está morto? Henry Martyn, ou Wilberforce, ou John Bunyan estão mortos? Aqueles que viveram por algo superior e além de si mesmos nunca morrerão no coração das pessoas por quem viveram e se doaram.
Wesley ou Whitefield, por acaso, estão mortos? Os nomes daqueles grandes evangelistas nunca foram mais honrados do que são hoje. John Knox está morto? Você pode ir a qualquer lugar na Escócia hoje e sentir a força de sua influência.
Vou contar para você quem é que está morto. Foram os inimigos daqueles servos de Deus: aqueles que os perseguiram e os denegriram falsamente. Foram eles que morreram de fato. As pessoas que eles atacaram sobreviveram a todas as mentiras que foram proferidas a seu respeito. Não somente isso; brilharão intensamente na era porvir. Quão verdadeiras são as palavras da Bíblia: “Os que forem sábios, pois, resplandecerão, como o fulgor do firmamento; e os que a muitos conduzirem à justiça, como as estrelas, sempre e eternamente” (Dn 12.3).
Continuemos, portanto, a conduzir à justiça tantos quantos pudermos. Vamos morrer para o mundo, para suas mentiras, para seus prazeres e suas ambições. Vivamos para Deus, e saiamos continuamente para ganhar almas para ele.
Extraido de “The Overcoming Life” (A Vida Vencedora).
[1] Antigamente “luzes baixas” se referiam a luzes colocadas na praia, alinhadas com o farol com a finalidade de auxiliar os barcos a entrar nos canais dos portos.