21 de dezembro de 2024

Ler é sagrado!

Devocional: O Verdadeiro Sentido da Páscoa

Por: Lance Lambert

Em algum lugar na eternidade passada, antes da fundação do mundo, antes mesmo que o homem caísse, o clamor de Deus ecoou através dos céus: “A quem enviarei e quem irá por nós?” (Is 6.8). Era o clamor do coração do Pai quando anteviu e deparou com o complexo problema do pecado e vergonha humanos; o problema aparentemente insolúvel de uma humanidade “satanizada”.

A resposta ao problema não era a destruição dos homens, embora, se não fosse pelo amor de Deus, aquela teria sido uma solução simples. A resposta seria a reconciliação dos homens, trazê-los de volta ao plano e propósito originais de Deus, em eterna união com ele. Foi o Filho quem respondeu, tanto ao chamado como ao problema – “Eis-me aqui, envia-me a mim”.

Estas maravilhosas palavras: “Então disse eu: eis aqui venho; no rolo do livro está descrito a meu respeito: deleito-me em fazer a tua vontade, ó Deus meu”, cumpriram-se quando o Messias Jesus veio a este mundo (Sl 40.8; cf. Hb 10.5-10).

É claro que desde o princípio, Jesus, como homem, sabia exatamente qual era a sua obra. Desde o momento em que Pedro fez sua grande confissão: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16.16), Jesus começou a revelar aos seus discípulos qual era sua suprema obra. Toda a sua vida, até este momento, havia sido tão somente uma preparação para isto. O dia da sua grande obra, que representa o foco central de todo o tempo e história, e do qual depende o divino propósito da salvação e redenção, chegou com a sua crucificação.

Quanto Custou a Jesus

Contudo, não devemos nunca cair na armadilha de pensar que, pelo fato de a obra da nossa salvação ter-se completado no curso de um breve dia, foi fácil para o Messias. Custou-lhe tudo! Naquelas poucas horas condensou-se um mundo de sofrimento e angústia que supera toda a imaginação humana.

A linguagem é totalmente inadequada, mesmo quando divinamente inspirada, para descrever ou interpretar aquela espécie de sofrimento. Nenhum dos escritores dos evangelhos tentou descrever os REAIS sofrimentos do Messias. Eles registraram pura e simplesmente os fatos.

Mesmo os apóstolos declararam apenas suas conseqüências espirituais e sua interpretação – que ele levou nossos pecados, que ele sofreu em nosso lugar, que ele foi feito pecado por nós. Em momento algum, tentaram descrever o custo e o sofrimento. É como se todos estivessem cientes de que isso estava além dos limites da linguagem e da compreensão humana; que era algo tão santo, tão maravilhoso, tão misterioso e inescrutável, tão imenso e eterno em sua significação, que a mais eloqüente oratória do mundo fracassaria em descrevê-lo e a mais refinada mente teológica falharia em defini-lo.

A história real de como aquele que não tinha pecado foi feito pecado por nós, de como o Cordeiro de Deus se tornou, naquelas terríveis horas, a “serpente levantada” (2 Co 5.21; Jo 1.29; Jo 3.14), nunca poderá ser contada. Tudo o que temos são indícios que revelam profundezas impenetráveis de angústia e sofrimento. Vemos os atos; observamos a humilhação, a tortura, o escárnio. Ouvimos suas palavras e seu clamor; vemos suas reações, a dor física e a morte.

Assistimos a tudo e estamos cônscios de que esta é uma parte mínima da história. Porque os sofrimentos físicos do Messias não foram os reais sofrimentos pelos quais passou. Eram apenas indícios exteriores de uma infinita e inexprimível dor. Seu verdadeiro serviço foi oferecido e realizado no domínio do invisível. O servo do Senhor passa, como passou, fora do alcance da nossa visão dentro da escuridão; além desse ponto não podemos penetrar. Chegamos ao limite da nossa finita habilidade de entender e apenas podemos curvar nossas cabeças e nossos corações.

Lá, naquele lugar de escuridão, sua alma tornou-se a oferta pelos nossos pecados; ele foi ferido, traspassado pelas nossas transgressões, moído pelas nossas iniqüidades. Lá, ele sofreu pelo nosso bem-estar, pela nossa paz; foi castigado, para que as nossas infelizes e torturadas consciências pudessem conhecer paz com Deus. Lá, nossas tristezas e pesares foram levados por ele; nossos males e enfermidades acharam nele seu alvo (ver Is 52.13-53.12).

Ele tomou sobre si tanto a raiz como o fruto de todo o pecado, pois toda a nossa iniqüidade foi colocada sobre ele. Foi o pecado de todo o mundo que ele levou sobre si – toda a sua maldade e impiedade, toda a sua incessante odiosidade, a dor de toda a história. Naquelas poucas horas tudo isso foi ajuntado e colocado sobre aquela querida estrutura humana.

O Cordeiro de Deus

Não foi por alguma estranha coincidência que o Messias morreu por ocasião da Páscoa. Aquela festa comemorava a gloriosa libertação por Deus de um povo em escravidão e miséria. Além disso, no centro daquela comemoração estava um cordeiro imolado, um cordeiro sem mancha, macho de um ano, cujo sangue fora colocado sobre a verga e sobre os umbrais das portas de cada família crente.

João Batista disse de Jesus: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!” (Jo 1.29). Não foi portanto, por acaso que o Messias morreu quando os cordeiros estavam sendo imolados para a comemoração. Ele era a realização daquele antigo simbolismo.

Para os poderes satânicos das trevas, foi a sua hora. Quando, no Getsêmani, eles se acharam impotentes para impedir que a obra do Messias fosse completada, seu ódio e furor não conheceram limites. Foram tão terríveis aquelas horas finais que até mesmo a criação retrocedeu em horror.

Colossenses 1.17 declara que “nele subsistem todas as coisas”. Quando o Messias foi feito pecado por nós e tornou-se uma “maldição”, foi como se a criação natural, toda contida nele, entrasse em choque. A terra tremeu, as pedras se fenderam (Mt 27.51) e a luz da natureza mergulhou em trevas (Mc 15.33). Foi como se o próprio ser de Deus fosse envolvido por uma insuportável dor e, em conseqüência, o próprio universo fosse afetado.

Mesmo que não compreendamos o mistério desta questão, ela revela algo da realidade e profundidade dos sofrimentos do Messias. Vindo daquelas negras e impenetráveis profundezas de dor e escuridão ouvimos, ecoando pelos séculos, o temível brado do coração partido do Messias: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Mc 15.34).

O Messias foi feito pecado por nós e “foi da vontade do Senhor esmagá-lo”; era o próprio Deus que submetia o Messias ao sofrimento. Jesus estava sozinho, não apenas no nível humano; foi desamparado pelo próprio Pai por causa do nosso pecado.

Toda a extensão do que ele fez, precisamente como sofreu, como se tornou nosso pecado, o imensurável preço envolvido – tudo está muito além da nossa capacidade de compreensão. O que nós sabemos e conhecemos por experiência, se realmente cremos nele, é que ele nos salvou. De algum modo, além da nossa limitada compreensão, um vasto universo de pecado, de dor e infelicidade, de sofrimento e morte, foi concentrado nessa experiência. O Senhor depositou sobre ele a iniqüidade de todos nós e ele as levou embora para o esquecimento.

Ele pagou o derradeiro preço, à custa da sua própria vida, e sofreu pelos nossos pecados, o justo pelo injusto, de maneira a trazer-nos para Deus.

O Messias provou a morte por cada homem, para daí em diante trazer muitos filhos à glória (Hb 2.9-10).

Por Que Ele o Fez?

Por estranho que possa parecer, é na zombaria cruel dos principais sacerdotes e escribas que deparamos com a verdade. Eles, inconscientemente, profetizaram quando disseram: “A outros salvou; a si mesmo não pode salvar” (Mc 15.31).

Eles nunca proferiram palavra mais verdadeira. Toda a sua vida foi gasta para a salvação dos outros da morte, da corrupção, da escravidão e da doença, do pecado e de Satanás. Agora, contudo, no sentido mais profundo, ele não podia salvar a si próprio.

Não que não tivesse poder para fazê-lo. Todo o poder do universo estava ao seu comando, mas ele o usaria tão somente para sacrificar-se, não para salvar-se. Foi o seu amor por nós que aboliu qualquer possibilidade de autopreservação! Não foram os cravos que o prenderam ao madeiro, nem a presença dos rudes soldados que o guardavam lá, mas um amor Divino. Aquele amor o cravou na cruz com mais eficácia que qualquer outra coisa no universo.

Verdadeiramente, o amor de Jesus ultrapassa o conhecimento. É inteiramente inexplicável. Havia muitas coisas que o Servo do Senhor poderia ter feito, mas para que servisse a Deus verdadeiramente, o amor ao Pai e o amor por nós o fez rejeitá-las. Há nisso uma profunda lição para todos os que desejam servir a Deus. Há muitas coisas que poderíamos fazer mas, se verdadeiramente servimos a Deus, descobriremos que não poderemos fazê-las, por amor a Deus e por amor aos outros. O amor Divino sempre nos prenderá à vontade de Deus; sempre nos tornará prisioneiros do Senhor Jesus.

Os principais sacerdotes e escribas estavam totalmente cegos ao que acontecia naquela cruz. O Messias não podia salvar-se a si próprio, porque estava nos salvando e seria impossível fazer os dois ao mesmo tempo. Ele tinha de escolher entre salvar-se e salvar ao homem caído – por infinito amor e graça, escolheu salvar o homem caído. Na verdade, seu amor era tão grande, que através de sua morte, estava abrindo as portas da salvação até mesmo aos principais sacerdotes e escribas. Anás e Caifás, Pilatos e a multidão que zombou e escarneceu dele naquele dia – todos podiam encontrar vida, se tão somente se voltassem para Deus e cressem nele.

Eles pensavam que Jesus estava acabado, que o seu “estranho” poder e influência estavam quebrados e os seus lábios finalmente silenciados. Não poderiam estar mais enganados. Porque exatamente ali, onde aquelas mãos e pés estavam pregados à cruz, onde aparentemente nenhum grande milagre foi realizado, nenhum poder dinâmico demonstrado, nenhuma poderosa mensagem pregada – ali o milagre dos milagres foi efetuado, o mais poderoso e eficaz poder na história das eras foi manifestado e a maior mensagem a ser pregada na terra foi pronunciada. Quando Jesus morreu com aquele grande brado: “Está consumado”, o véu do Templo rasgou-se em dois, de alto a baixo (Jo 19.30; Mc 15.37-38). O Messias nunca proferiu uma mensagem mais poderosa e significativa do que aquela que foi contida nesta palavra, “consumado”, nem jamais exerceu poder mais eficaz do que quando consumou a obra da nossa salvação e nos reconciliou com Deus.

Quando Jesus morreu, o véu do santuário se rasgou em dois, de alto a baixo, porque a condição para reconciliar a humanidade caída com Deus fora cumprida através do Messias. Aquele véu simbolizava a alienação do homem caído da presença de Deus, estando ele aquém da glória de Deus por causa do pecado. Representava o fechamento dos portões da Cidade Eterna, o lugar da habitação de Deus, para aquela espécie de homem, barrando-o de toda aquela ordem de vida.

Mas agora aquele véu fora rasgado pelo próprio Deus; ele mesmo destrancou e abriu aqueles portões. O que ninguém mais poderia fazer, o Messias fez. Ele não somente ganhou para nós uma eterna salvação, por mais tremenda e maravilhosa que seja, por si só, este fato! Porém, ele também pôs fim à antiga ordem, à velha criação, ao velho homem e à velha natureza! E, como o Servo de Deus, assentou uma sólida e eterna base para uma nova ordem, uma nova criação, um novo céu e uma nova terra, onde há justiça. Um novo homem veio através dele. Toda esta ordem das coisas que foi instituída através de Satanás, por causa da queda do homem, foi julgada e extirpada no Messias; nele foi crucificada, sepultada e lançada fora para sempre.

Além disso, naquele mesmo lugar de julgamento, uma porta de esperança foi aberta. Um novo dia raiou na noite que, humanamente falando, parecia ser a mais negra de todas. Para todos os que temiam ao seu nome, o Sol da Justiça levantou-se com cura nas suas asas. Para estes, um novo e eterno dia, com nova vida, novo poder e novo propósito, estava chegando. Para o Servo do Senhor, Jesus, os portais eternos estavam levantando suas cabeças. Ele adentrou-os triunfantemente e juntamente, somente pela graça de Deus, todos aqueles que criam nele também entraram.

Cada aspecto do Messias Jesus é singular. Seja o mistério da sua pessoa, ao mesmo tempo, Deus e homem; seja o fato das muitas profecias que predisseram sua vinda, seu nascimento, sua obra suprema e a glória que se seguiria; ou seja a beleza do seu caráter – ele é único. E se isso o coloca muito acima de tudo e de todos, sua obra apenas acrescenta mais à sua singularidade. Pois ninguém mais poderia ter feito o que o Senhor Jesus fez.

Como está escrito de maneira simples e profunda na Enciclopédia Judaica: “Se, como os cristãos crêem, o mártir Jesus foi ao mesmo tempo o Messias, então sua morte tem uma importância cósmica”.

Em tudo isso, vemos um pouco do que custou ao Messias realizar a obra que Deus lhe confiou. Foi um preço além da imaginação humana, porém ele, voluntariamente, pagou aquele preço e a si mesmo se ofereceu. Desde que somos tão não merecedores, levanta-se a questão sobre o porquê ele entregaria sua vida por nós. Há somente uma resposta adequada. Ele não morreu por amor ao dever, nem por satisfação e glória próprias.

Nem mesmo poderíamos dizer, em um nível mais elevado, que morreu somente para a honra e glória de Deus, sem qualquer consideração por nós, como povo. Ele se tornou o Cordeiro de Deus e levou sobre si nossos pecados por causa do seu imensurável e imortal amor. Como colocou o apóstolo Paulo: Ele “me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gl 2.20). Tal amor é tão inescrutável quanto inexplicável.

O Rei dos Reis

Nisto vemos o coração de Rei e Messias. Ele não é o Rei messiânico meramente pela sua linhagem, ainda que esta fosse tanto autêntica quanto pura; realmente era da descendência direta do rei Davi. Nem é o Rei messiânico só porque foi predestinado para o ser, ainda que este fato estivesse predito desde o princípio e divinamente pré-ordenado. Ele é Rei primordialmente porque é digno de ser Rei e de assumir o trono. Nele vemos a espécie de caráter e natureza que não pode fazer outra coisa senão reinar. Através desse caráter interior, ele transformou uma coroa de espinhos na mais inestimável e radiante coroa jamais usada por alguém.

Nele vemos um conceito de realeza, liderança e autoridade, que não tem par. Este conceito se baseia em caráter, em altruísmo, em uma obra sacrificial e em uma vida inteiramente dedicada aos outros. Seu reinado está fundado em amor divino, em absoluta verdade e em transparente realidade.

Isto, por si só, é razão suficiente para chamá-lo digno. O apóstolo João, em sua visão do céu e da eternidade, viu no centro de tudo o trono de Deus e no trono um “Cordeiro, como havendo sido morto” (Ap 5.5,6). No glorioso coração de uma vasta e triunfante multidão de adoradores num novo céu e nova terra, está o crucificado Messias. O “Cordeiro, como havendo sido morto” é o Messias entronizado, levando para sempre as cicatrizes do seu sofrimento, as marcas dos cravos em suas mãos e pés e a marca da lança no seu lado.

João viu o Messias tomar o livro selado com sete selos, representando a mente e a vontade de Deus, a qual ninguém, judeu ou gentio, fora capaz de compreender, e assistiu-o romper os selos e abri-los. O Messias Jesus cumprira o eterno propósito de Deus, redimindo uma inumerável multidão de cada nação na terra e trazendo muitos filhos à glória. Ninguém mais, em tempo algum, foi achado digno de herdar o trono de Deus, para poder restaurar todas as coisas ao Pai e realizar toda a sua vontade, durante todas as eras por vir.

No “Cordeiro, como havendo sido morto”, a chave para a história judaica foi finalmente encontrada, desvendando tudo o que antes era inexplicável e tornando em glória seus infortúnios. Pois o propósito de Deus não foi frustrado, mas cumprido através da queda do povo judeu; nem o seu amor por esse povo desvaneceu com a sua queda, pelo contrário, provou-se, através dos anos, imortal. No fim, todo o Israel, o verdadeiro povo eleito de Deus, judeus e gentios, será salvo para não mais pecar e a terra será cheia com o conhecimento da glória do Senhor, como as águas cobrem o mar.

Deus declarou solenemente, desde o princípio: “Tão certo, porém, como eu vivo, e como a glória do Senhor encherá toda a terra…” (Nm 14.21).
Naquele dia, as palavras proféticas de Isaías se cumprirão: “Todo vale será levantado, e será abatido todo monte e todo outeiro; e o terreno acidentado será nivelado e o que é escabroso, aplanado. A glória do Senhor se revelará; e toda a carne juntamente a verá; pois a boca do Senhor o disse” (Is 40.4,5).

Da destra de Deus o Messias Jesus, Cordeiro de Deus e Leão de Judá, reinará para sempre. O Rei dos Judeus tornou-se o Rei dos reis e Senhor dos senhores e “do aumento do seu governo e da paz não haverá fim, sobre o trono de Davi e no seu reino, para o estabelecer e o fortificar em retidão e em justiça, desde agora e para sempre; o zelo do Senhor dos Exércitos fará isso” (Is 9:7).

As palavras proféticas do Rei Davi concernentes ao Messias, proferidas tanto tempo atrás, finalmente se concretizarão (ver Sl 72.17-20): “Permaneça o seu nome eternamente; continue a sua fama enquanto o sol durar, e os homens sejam abençoados nele; todas as nações o chamem bem-aventurado. Bendito seja o Senhor Deus, o Deus de Israel, o único que faz maravilhas. Bendito seja para sempre o seu nome glorioso, e encha-se da sua glória toda a terra.Amém e amém.”

Extraído do livro “The Uniqueness of ISRAEL”, por Lance Lambert, 1980; páginas 246-254. Publicado originalmente na revista À Maturidade.

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