Por Francis Frangipane
Cuidado, que ninguém os engane
Uma grande parte de nossa experiência cristã se baseia na assimilação e na digestão de conhecimento. Na primeira vez que nos achegamos a Cristo, atentamos para a satisfação de nossas necessidades. Infelizmente, nossos poderes espirituais de discernimento não estão desenvolvidos o suficiente e, freqüentemente, absorvemos falsos conhecimentos que inibem ou mesmo impedem o nosso crescimento. Em vez de amadurecermos no Senhor, somos meramente instruídos segundo os conceitos de nossos primeiros mestres – e nem todos esses conceitos são bíblicos.
Sentimos certa repulsa por igrejas que adornam seus salões com estátuas religiosas e imagens de santos. Mas uma falsa imagem de Deus pode se fixar em nossa mente da mesma forma que uma estátua é fixada sobre o gesso – e não terá vida da mesma forma. Se nosso conhecimento de Deus não for abastecido da sua vida e do seu poder, o mero conhecimento dele se torna um ídolo em nossa mente.
Tanto eu como você temos idéias, imagens falsas de Deus que o Espírito Santo removeria, se permitíssemos. São tradições culturais e doutrinárias que impregnaram nossa mente. O poder da vida de Cristo é filtrado e, proporcionalmente, reduzido pelo número dessas imagens erradas que existem dentro de nós. Indivíduos, igrejas e, até mesmo, nações sobrepõem suas tendências ao nosso conceito de Deus. Nações pobres e ricas deduzem que o criador vive e pensa como eles. Não estão servindo a Deus, mas à imagem que têm de Deus. Aliás, o Deus vivo não é branco nem negro. Não é grego nem judeu, nem católico, nem protestante. Ele é Deus! E, como escreveu o salmista, “o nosso Deus está nos céus, e pode fazer tudo o que lhe agrada!” (Sl 115.3).
Não podemos treinar o Senhor para que pense como um de nós. Ele é o criador soberano, a fonte da vida no universo. Embora os ídolos sejam mais “seguros” para a nossa natureza carnal que o Deus vivo, um ídolo não pode nos ressuscitar, nem nos curar quando estamos doentes, nem nos libertar de nós mesmos ou do diabo. A única razão pela qual toleramos ídolos mortos é porque, embora não possam nos socorrer, também não podem nos causar dano nem nos convencer do pecado. Não conseguimos ter noção das conseqüências ao abrigarmos ídolos, uma vez que “tornam-se como eles aqueles que os fazem, e todos os que neles confiam” (Sl 115.8).
Em Mateus 24, Jesus avisou sobre o enorme poder do engano que seria desencadeado nos últimos dias. Ele iniciou seu discurso com o aviso: “Cuidado, que ninguém os engane” (v. 4). Por cinco vezes nos vinte e dois versículos seguintes, ele repetiu esse aviso, dizendo que muitos seriam enganados, declarando que haveria “falsos Cristos”, “falsos mestres”, “falsos profetas”, bem como “grandes sinais e maravilhas para, se possível, enganar até os eleitos” (Mt 24.24). Mas, em meio à sua profecia, o Senhor declarou que “este evangelho do Reino será pregado em todo o mundo como testemunho” (v. 14). Atente para o termo “este evangelho”. O evangelho, exatamente como Jesus o ensinou, com seu poder de curar, libertar e tornar o homem santo será proclamado como testemunho, “e então virá o fim” (Mt 24.14).
O que é este “Evangelho do Reino”? É a mensagem integral de Jesus Cristo. Ela é mais exigente, mais gratificante, mais sagrada e mais poderosa que o “evangelho” do típico cristão moderno. De acordo com Jesus, quando alguém encontra o Reino de Deus, para usufruir dele vai, vende tudo quanto tem (Mt 13.44). Uma vez achado, deve ser desejado acima do alimento e do vestir diário; é um tesouro tão valioso que melhor seria sofrer a perda de uma mão ou de um olho do que a do Reino (Mt 6.23; Mc 9.47). É o evangelho que nos custa tudo, mas nos dá o melhor de Deus. Em meio ao materialismo, indiferença e rematadas fraudes, este evangelho do Reino é a mensagem que, Jesus disse, seria proclamada nos últimos dias.
E se estamos ouvindo algo que não nos posiciona corretamente no caminho para o reino de Deus, se não estamos nos tornando como Jesus em santidade e poder, estamos sendo enganados e esse falso conhecimento é um ídolo.
Deus é maior que nosso conhecimento sobre ele
Lembre-se: é extremamente improvável que tudo o que lhe foi ensinado desde a primeira vez que aprendeu sobre Cristo seja de Cristo. Não podemos permitir que nossos pensamentos a respeito de Deus sejam tão imutáveis quanto Deus, pois estamos em um processo de transição e há muito que aprender, reaprender e esquecer. O Senhor quer que tenhamos nossas raízes fixas nele, e não em idéias a seu respeito. Devemos ser suficientemente confiantes em seu amor para que possamos arrancar idéias erradas. Um ídolo é um ídolo.
O Reino de Deus não é uma religião; é um relacionamento com Jesus Cristo que nos toma por inteiro e está em constante expansão. É tão distinto da religião como o é um anjo brilhante de um fantasma sombrio. Se você imagina que Deus é religioso, tenha em mente que não havia religião no Éden. O único templo em que Deus habita sobre a terra é o templo de nossos corpos. João, no livro do Apocalipse, é bastante claro. Ele fala sobre o céu, onde “não vi templo algum” (Ap 21.22).
O Pai não quer que prestemos culto ou sirvamos a algo que a mente limitada do homem possa visualizar. Ele é mais magnífico do que a visão que temos dele. Conhecimento é importante, mas é meramente simbólico; não passa de um reflexo da realidade, nunca chega à essência. Nossos pensamentos servem de alguma ajuda, mas não são abrangentes. Mesmo na própria Bíblia, Jesus disse: “Vocês estudam cuidadosamente as Escrituras, porque pensam que nelas vocês têm a vida eterna. E são as Escrituras que testemunham a meu respeito; contudo, vocês não querem vir a mim para terem vida” (Jo 5.39,40).
Nossa vida não vem da Bíblia; ela vem de Jesus. Aqueles que escreveram a Bíblia o fizeram para testemunhar a respeito dele. Os profetas do Antigo Testamento apontam para ele; os autores do Novo Testamento nos direcionam de volta para ele. Se realmente compreendermos o que eles escreveram, deveremos encontrar o que eles encontraram.
Compreenda, não estamos em busca de conhecimento, estamos em busca de Deus! Nossa ânsia não é por fatos, mas por plenitude (Mt 5.6). Deus é maior do que o nosso conhecimento sobre ele. Se tivermos verdadeiramente alcançado o Deus vivo, nosso conhecimento ficará timidamente sob a sombra de temor e assombro.
O conhecimento nos informa que Deus é eterno; mas “eterno” é somente uma palavra para nós. Que tipo de vida ele tem, em que os bilhões de anos do longo e pleno círculo do tempo têm nele tanto seu fim como seu início? Nossas doutrinas nos dizem que ele é o criador, mas que tipo de poder emana de sua pessoa para que galáxias inteiras sejam criadas pelas suas palavras e, por um decreto da sua boca, nossa terra se encha de vida? Nós o definimos como onipresente e onisciente, mas como descrever pelo conhecimento a sua capacidade de estar em todos os lugares ao mesmo tempo e ter ciência de cada um de nós, mesmo do número de cabelos em nossa cabeça?
Nossas palavras são infinitamente inadequadas para a descrição de sua verdadeira pessoa. Na verdade, em comparação com a realidade eterna que nos separa, nosso conhecimento não é mais do que leite com o qual nos amamentamos. Na melhor das hipóteses, nossas doutrinas tão somente acalmam nossas ansiedades e organizam nossas crenças. Mas na realidade da sua presença não há uma paz e um amor que excedem a todo o conhecimento (Fp 4.7; Ef 3.19)? Como podemos medir e definir o que Paulo chama de “as insondáveis riquezas de Cristo” (Ef 3.8)?
Há uma diferença entre buscar respostas e buscar o Senhor. Há uma diferença entre a sabedoria de segunda mão achada nos livros e um encontro direto com o Deus vivo. O Senhor deve se tornar tão real, tão pleno e absorvente para nós quanto era o mundo quando vivíamos no pecado.
Então o clamor em nosso coração deve ser: “Deixe que Deus seja Deus! Deixe-o ser para nós o que realmente é”! O conhecimento correto é vital, mas nós queremos mais que somente conhecimento. Queremos que a presença do Todo-Poderoso preencha o vácuo em nossas doutrinas com a mesma essência que há nele.
Existe uma história sobre Santo Agostinho que ajudará a explicar o meu argumento. Agostinho é considerado por muitos o maior dos pais latinos e um dos mais destacados doutores da igreja ocidental. Seus escritos estabeleceram e fundamentaram o pensamento cristão por mais de mil anos.
Sua grande obra inclui Confissões e A Cidade de Deus. No fim da vida, em seu leito de morte, estava cercado pelos amigos mais íntimos. Sua respiração parou, seu coração falhou e uma imensa sensação de paz preencheu o quarto quando ele partia para estar com o Senhor. De repente, ele reabriu os olhos; com a face, antes pálida, agora corada e iluminada, falou: “Eu vi o Senhor. Tudo que tenho escrito não vale mais que uma palha”.
Podemos ter idéias, podemos possuir um conhecimento das Escrituras extremamente apurado, podemos ter sonhos e visões, mas tudo o que pensamos saber não passa de palha em comparação com a verdadeira realidade da presença de Deus.
O Senhor é maior, mais maravilhoso e mais poderoso que a soma do conhecimento de todos a respeito dele. Ele é Deus, e “pode fazer tudo o que lhe agrada” (Sl 115.3).
Por que estamos focando nossas energias e nossos pensamentos no arrependimento da idolatria? Porque, no mesmo local onde habitam os ídolos do ego e do falso conhecimento, o Deus vivo escolheu fazer brotar sua presença. O verdadeiro e eterno Deus não pode ser fundido com os falsos deuses desta era. Não podemos servir a dois mestres. Não podemos ter o seu poder e santidade em nós sem que primeiro o tenhamos em nossa vida. E se não estamos sendo paulatinamente transformados em sua santa e poderosa imagem, podemos estar servindo a um ídolo: o ídolo do falso conhecimento.
Extraído do livro O Desafio da Santidade, por Francis Frangipane (Editora Vida,São Paulo, 2001). Reproduzido com permissão.
Francis Frangipane é pastor sênior da Igreja River of Life em Cedar Rapids, IA, EUA,e dirige vários outros ministérios para o Corpo de Cristo no mundo inteiro, como treinamento de líderes, literatura, conferências com pastores e outros. Mais informações no site: www.frangipane.org.