Por: Eliasaf de Assis
Jesus Nosso Modelo
A sala de parto de sua mãe foi uma estrebaria, e seu primeiro berço foi um coxo de alimentar animais (Lc 2.7). Seus pais o apresentaram, o bebê mais caro do universo, fazendo por ele a oferta do pobre (Lc 2.21-24; Lv 14.21,22).
Em sua época, o trabalho era socialmente dividido entre braçal e intelectual. Nesta última categoria estavam os oficiais do exército, os fiscais e executivos do estado, a burguesia rural e o clero. Não obstante seu brilho e capacidade, ele foi um trabalhador braçal, e na pobre vila em que viveu boa parte da vida, em pouco ou nada impressionou seus conterrâneos (Mc 6.3). Seus olhos velavam por aqueles ainda mais pobres que ele: desde a viúva que deu tudo que tinha, ao discípulo aflito com os impostos, e que por sua direção acabou pescando o peixe mais extraordinário de todas as pescarias (Mc 12.44; Mt 17.27).
Não foi socialmente ingênuo, chegando a chamar o governador de “raposa” (Lc 13.32), mas sua luta contra a miséria falava ao espírito dos homens e nunca fez uso da revolta, comum tanto naquele tempo como atualmente. Sempre pregou a verdade em amor, nunca fez acepção de pessoas, e conviveu com a mesma naturalidade entre ricos e pobres. Todo rico que ouviu sua palavra e creu, tornou-se menos rico por amor a ele. Sua simples e doce presença em um almoço trazia contrição e real conversão ao coração do opressor. Tal arrependimento era canalizado no repartir ao pobre, a tal ponto que quem repartia tornava-se pobre, irmanando-se a quem havia lesado, e não se importando com sua bancarrota pois recebera algo muito melhor, o reino de Deus (Lc 19.8).
Dele o profeta Zacarias falou: “Alegra e exulta, teu rei virá a ti, salvador, pobre e montado em um jumentinho” (Zc 9.9). O povo, quando viu, entendeu e saudou ao pobre que também era rei (Lc 19.38).
Hoje muito dinheiro é gasto para clonar uma célula, prevendo-se os trilhões que serão ganhos pela indústria com a comercialização de produtos e tratamentos. Ele, porém, multiplicou as moléculas de cinco pães sem nenhum esforço, movido por seu cuidado e amor inefável pela multidão que já faminta o ouvia.
Foi assassinado, e seu corpo dilacerado pregado em uma rústica cruz. Ah, todos os crucifixos deste mundo, incrustados de pedras e adornos, não podem comparar-se à trave de madeira tosca e rude onde meu Senhor foi suspenso. Ali, em um objeto que não era uma jóia, mas um instrumento de martírio, provavelmente feito com madeira de segunda mão, o Rei dos reis, o Senhor dos senhores, o Logos criador do universo, agonizou. Ele, que era imensamente rico, se fez pobre por amor de nós. A carne que nunca conheceu pecado, e envolveu o Verbo divino, foi sepultada em um túmulo cedido por um homem rico. Ao nascer e morrer, seu precioso corpo repousou em lugares emprestados.
Foi esta dedicação de Jesus à pregação das boas novas aos pobres um de seus argumentos a respeito de seu caráter messiânico: “Os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados, e aos pobres está sendo pregado o evangelho” (Mt 11.5).
O Paradoxo do Nosso Evangelho
No Brasil, desde pelo menos a década de 1980, grandes contingentes da classe média e alta têm encontrado o evangelho. Podemos notar este fenômeno facilmente através dos programas evangélicos na televisão, e das revistas evangélicas com seu requinte e seus temas típicos de classe média. O termo gospel, em nosso país, passou a designar uma categoria de pessoas crentes culturalmente contextualizadas, estudadas, com elevados padrões de consumo e sem nada de “caretice”. Nossos shows são bem aparelhados e requintados, em nada devendo às melhores bandas seculares nacionais. O evangelho tem avançado, e perdido a fama tão comum no Brasil até a década de 80: a de que os evangélicos eram “pobres, tapados e burros”. Esta era uma ofensa terrível, mas com que prazer poderíamos recebê-la! Aproximava-nos dos mesmos rejeitados e desprezados por quem Jesus nutria tanto amor! Aproximava-nos daquele que se fez pobre por amor de nós.
“Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que pela sua pobreza vos tornásseis ricos” (2 Co 8.9).
Tenho diante de mim uma foto selecionada por um missionário, Viv Grigg, que serve a Deus entre os pobres. É um panorama de uma grande e pobre cidade asiática. Um belo templo evangélico é o prédio mais proeminente da paisagem. Ele é visto pelos fundos, pois suas portas estão voltadas para o outro lado da cidade. O missionário subiu em uma gigantesca pilha de lixo que fica na região aos fundos da igreja. É deste grande depósito de lixo que crianças, mulheres e homens, esquálidos e magros, mas sorridentes, retiram seu sustento em forma de sucata para vender ou mobiliar os seus lares. A conclusão do missionário é exatamente o tema deste texto: o povo de Deus tem dado as costas aos pobres.
O contraste social das cidades brasileiras também imiscuiu-se entre nós: grandes obras arquitetônicas e templos semelhantes a palácios cujas portas não estão voltadas para o pobre. Considerando a arquitetura e o vestuário como expressões de cultura e opinião, o que estamos dando a entender ao pobre? Que será aceito e ambientado em nossas reuniões, ou que será confrontado pelo mesmo contraste entre ele e nós que encontra no resto do mundo? Isto afasta ou aproxima o pobre e necessitado do evangelho?
“Porque, se no vosso ajuntamento entrar algum homem com anel de ouro no dedo, com vestes preciosas, e entrar também algum pobre com sórdida vestimenta, e atentardes para o que traz a veste preciosa e lhe disserdes: Assenta-te tu aqui, num lugar de honra, e disserdes ao pobre: Tu, fica aí em pé ou assenta-te abaixo do meu estrado, porventura não fizestes distinção dentro de vós mesmos e não vos fizestes juizes de maus pensamentos?
Ouvi, meus amados irmãos. Porventura, não escolheu Deus aos pobres deste mundo para serem ricos na fé e herdeiros do Reino que prometeu aos que o amam?
Mas vós desonrastes o pobre. Porventura, não vos oprimem os ricos e não vos arrastam aos tribunais?” (Tiago 2.2-6).
Se nosso adorado Senhor identificou-se com os pobres, e se a pregação aos pobres é a atividade que caracteriza sua unção e obra salvadora, não nos será difícil constatar o seu coração pesaroso ao ver que seu povo não tem a mesma prioridade.
Buscando a Deus na Senda dos Pobres
“O Espírito do Senhor é sobre mim, pois que me ungiu para evangelizar os pobres, enviou-me a curar os quebrantados do coração, a apregoar liberdade aos cativos, a dar vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos, a anunciar o ano aceitável do Senhor” (Lc 4.18,19).
A característica de uma igreja cheia da mesma unção que Jesus tinha, além de prodígios e sinais, é sua dedicação à pregação das boas novas aos pobres. Um avivamento é autenticado quando os membros do corpo de Cristo pisam o chão da favela ou do sertão, como os belos pés do mensageiro que anuncia boas novas. Estes pés são belos porque são sujos, empoeirados e calejados por amor ao evangelho. Merecem ser lavados com amor e honra.
Qual a razão de tanta soberba, dificuldades de relacionamentos entre líderes e preocupações com a própria imagem? Faltam pés que busquem a Deus na senda dos pobres, homens de Deus que empoeirem seus pés para serem lavados.
O Dr. Mike Wells fala sobre um pastor indiano que decidiu jejuar até que tivesse um encontro com Jesus (Problemas, Presença de Deus e Oração, pg 124). No terceiro dia de jejum, ele ouviu alguém batendo à porta. Rapidamente foi abrir, desejoso de encontrar-se face a face com o Senhor. O que viu foi um rapaz seminu, desnutrido e feio, com moscas voando ao seu redor, que lhe disse: “Quer saber por que essas moscas voam sobre mim? É porque sou esterco. Minha mãe e meu pai me rejeitaram e todos me desprezam.” Dito isso, virou-se e foi embora.
Quando a porta se fechou, o professor ouviu o Senhor dizer: “Agora você viu minha face! Onde houver sofrimento, onde houver dor, onde houver rejeição, lá estou!”
“Então, os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome e te demos de comer? Ou com sede e te demos de beber? E, quando te vimos estrangeiro e te hospedamos? Ou nu e te vestimos? E, quando te vimos enfermo ou na prisão e fomos ver-te? E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que, quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes” (Mt 25.37-40).
Quais são os nossos modelos de liderança ou obra vitoriosa? Não são porventura os sistemas dinâmicos que demonstram sucesso, incorporando os mesmos valores de pragmatismo e lucro usados por este sistema que oprime o pobre? A maior parte da desunião que grassa em nosso meio tem muito menos a ver com doutrina do que com cobiça e a disputa por um segmento cada vez maior do “mercado”, da fama e dos lucros.
“Donde vêm as guerras e pelejas entre vós? Porventura, não vêm disto, a saber, dos vossos deleites, que nos vossos membros guerreiam? Cobiçais e nada tendes; sois invejosos e cobiçosos e não podeis alcançar; combateis e guerreais e nada tendes, porque não pedis. Pedis e não recebeis, porque pedis mal, para o gastardes em vossos deleites” (Tg 4.1-3).
Mas se dedicarmos tempo e visitação aos menos favorecidos, nossos corações serão sensibilizados pelo que realmente importa. Já vi documentários sobre o sertão ou sobre tragédias onde jornalistas cínicos e frios e teatrólogos frívolos e mundanos vertiam lágrimas sinceras e pungentes. Li a biografia de Oscar Schindler, um homem mundano e de coração leviano, mas que foi sensibilizado pelo sofrimento do povo judeu e salvou centenas do extermínio nazista. Se homens deste mundo podem ser tocados pela pobreza a ponto de se tornarem úteis, quanto mais os servos de Deus terão suas vidas enriquecidas em sentido e serviço quando se envolverem com o necessitado. Nossas práticas de espiritualidade têm enfatizado corretamente a oração e o jejum, mas há um jejum ainda mais nobre aos olhos de Deus:
“Seria este o jejum que eu escolheria: que o homem um dia aflija a sua alma, que incline a cabeça como o junco e estenda debaixo de si pano de saco grosseiro e cinza? Chamarias tu a isso jejum e dia aprazível ao Senhor?
Porventura, não é este o jejum que escolhi: que soltes as ligaduras da impiedade, que desfaças as ataduras do jugo, e que deixes livres os quebrantados, e que despedaces todo o jugo?
Porventura, não é também que repartas o teu pão com o faminto e recolhas em casa os pobres desterrados? E, vendo o nu, o cubras e não te escondas daquele que é da tua carne?
Então, romperá a tua luz como a alva, e a tua cura apressadamente brotará, e a tua justiça irá adiante da tua face, e a glória do Senhor será a tua retaguarda.
Então, clamarás, e o Senhor te responderá; gritarás, e ele dirá: Eis-me aqui; acontecerá isso se tirares do meio de ti o jugo, o estender do dedo e o falar vaidade; e, se abrires a tua alma ao faminto e fartares a alma aflita, então, a tua luz nascerá nas trevas, e a tua escuridão será como o meio-dia” (Is 58.5-10).
Um verdadeiro mover de Deus trará unidade, um coração inclinado à causa do pobre e admiração mútua entre os abnegados homens de Deus. Seremos um pequeno rebanho novamente, não necessariamente em número, mas certamente em razão de um só coração permeado pela singeleza e simplicidade.
A Voz Profética Sempre Convidou a Igreja a Voltar-se ao Pobre
Historicamente, o Senhor sempre alertou seu povo quanto ao cuidado com os pobres.
“E a multidão o interrogava, dizendo: Que faremos, pois?
E, respondendo ele, disse-lhes: Quem tiver duas túnicas, que reparta com o que não tem, e quem tiver alimentos, que faça da mesma maneira” (Lc 3.10,11).
A igreja primitiva herdou do judaísmo a cooperação e apoio aos necessitados. Mesmo os gentios convertidos eram generosos e caridosos. O trabalho era tido em alta estima e a preguiça condenada. Quando os novos convertidos eram atores, gladiadores, prostitutas ou pedintes (profissões comuns no império romano), suas “carreiras” eram interrompidas pelos irmãos, que preocupavam-se em treiná-los e envolvê-los, por intermédio dos membros ricos da comunidade cristã, em outras ocupações. Há mesmo correspondências de líderes em busca de trabalho para irmãos recém-convertidos (como você vê, fomos nós, os cristãos que criamos a primeira rede continental de RH, de Recursos Humanos!). Os presos crentes ou não crentes eram muito visitados pelos irmãos, e Clemente de Roma chega a alegar que “muitos” cristãos “voluntariamente se colocaram em cadeias para libertar outros”. (Vozes do Cristianismo Primitivo, pág. 97)
No período chamado de patrística, ou era dos pais da igreja, a primeira obrigação dos líderes era a religião pura e imaculada como a descrita por Tiago 1.27. Policarpo, discípulo de João, chega a chamar as viúvas e aqueles que não tinham quem os amparasse de “altar de Deus”. O Didaquê e Inácio de Antioquia afirmavam que negligenciar os pobres era o caminho da morte. A adoção de crianças órfãs por casais cristãos e mesmo por viúvas era freqüente e generalizada, a tal ponto que uma das resoluções mais importantes de Constantino foi facilitar a legalização de tantas crianças que haviam sido adotadas. Após a institucionalização do cristianismo pelo império, campeões da fé como João Crisóstomo pregaram duramente a uma igreja já enriquecida e envolvida com os negócios deste mundo:
“Esse freio de ouro na boca do teu cavalo, este aro de ouro no braço do teu escravo, esses adornos dourados em seus sapatos, são sinal de que estás roubando o órfão e matando de fome a viúva. Depois de morreres, quem passar pela tua casa dirá: ‘Com quantas lágrimas ele construiu esse palácio? Quantos órfãos se viram nus, quantas viúvas injuriadas, quantos operários receberam salários injustos?’ Assim nem mesmo a morte te livrará de teus acusadores.” (Uma História Ilustrada do Cristianismo, vol. 2, pág. 151)
Por sermões assim ele foi preso várias vezes e morreu no exílio. Mas essa voz encontrou novas expressões em outras gerações na história. Na Reforma Protestante, para sobreviver e expandir-se, a fé e a revolução industrial se miscigenaram. Era uma forma de contestar a ociosidade e falta de propósito da sociedade católica. O trabalho foi corretamente sacralizado, e a iniciativa pessoal para enriquecer foi eticamente aceita. Mas de forma semelhante ao novo sistema econômico que surgia, a pobreza era vista não como fruto da opressão, mas como conseqüência do pecado (E às vezes o é — ver texto na pág. 28). É famoso o raciocínio que afirma que as nações protestantes são ricas, pois têm a bênção de Deus, enquanto as católicas são pobres por sua idolatria e impenitência. As riquezas deste mundo tornaram-se sinônimo de bênção. Os pobres de Deus foram esquecidos.
Parafraseando Justo L. Gonzales, precisamos de profetas do deserto semelhantes a João Crisóstomo (Crisóstomo significa língua de ouro), clamando na cidade grande. Vozes que em nome do cristianismo puro e simples não se dobrem ao cristianismo orientado pela ética capitalista. A voz da igreja simples, que como um gigante, faça tremer os fundamentos de nossa sociedade, não porque sua língua seja de ouro mas porque suas palavras são do alto.
Contentamento: Mudando Nossas Aspirações Interiores
Na sociedade de hoje, o medo da pobreza nos escraviza, e faz com que vejamos a nós mesmos como pobres e não como pessoas que devem contribuir com o necessitado. Este medo da pobreza já foi muito bem detectado por outros autores:
“Pobreza não é apenas não ter, mas um espírito sempre temeroso de não ter. Esse temor influencia toda a raça humana, e é uma força tão grande que, embora a pessoa possua bastante, ainda tem a tendência de pensar que o que tem jamais será suficiente.” (Jack W. Hayford, A Igreja do Caminho, pág. 39)
Como diz o autor acima, “nascemos chorando e com as mãos prontas para agarrar o que queremos… Somente a obra da graça pode remover o nosso senso insaciável de conseguir cada vez mais, de possuir e de conservar.”
O medo da pobreza pode manifestar-se em forma de ansiedade e preocupação com o futuro, mas a principal patologia espiritual que causa no cristão é a idéia de que precisamos ser ajudados, que não possuímos nada para repartir com o pobre. Estamos sempre buscando algo mais, e não temos nenhuma satisfação com o que possuímos. Curiosamente, é o medo da pobreza que pode causar uma imensa miséria. Pode levar-nos a planejamentos precipitados para enriquecer:
“Os pensamentos do diligente tendem à abundância, mas os de todo apressado, tão-somente à pobreza” (Pv 21.5).
Ou a inveja e ganância:
“Aquele que tem olhos invejosos corre atrás das riquezas, mas não sabe que há de vir sobre ele a penúria” (Pv 28.22).
Não nego que tenhamos necessidades e precisemos que Deus nos socorra com provisões e finanças. Mas quero sublinhar que a maioria de nós vive sem contentamento.
Contentamento é a paz de Deus, a mesma substância, em estado sólido. É a paz celestial abrangendo nossa economia individual. É a alma encontrando a vontade de Deus em suas atividades e propriedades no dia-a-dia, e descansando. Isto significa que ao olhar tudo o que possuo ou recebo de salário, vejo a mão de Deus e encontro a satisfação que este mundo não consegue de forma alguma obter. Se tenho, Deus me deu, se não tenho é porque ele ainda não quer que eu tenha.
A ausência de contentamento é percebida pelo alto volume de murmuração e desapontamento. Ouvi a história de determinado irmão que resolveu colocar um gravador no bolso e registrar tudo o que falava durante o dia. Ao final da tarde, assustou-se com a quantidade de murmurações que proferiu durante o dia. Eu gostaria de sugerir a mesma experiência. Se você é casado, nem precisa arranjar um gravador. Pergunte ao seu cônjuge (caso julgue-se capaz de agüentar a resposta)!
Conheci um jovem pastor, que trabalhava como meu subordinado em uma grande empresa. Quando recebíamos o hollerith, o ambiente tornava-se azedo e cheio de reclamações. Mas este jovem pastor, recém-casado, morando na cidade há pouco tempo, tinha o semblante iluminado pela gratidão. Ele tinha contentamento em tudo o que o Pai lhe dava ou negava. Eu ganhava mais que o dobro que ele, e um dia ele ofereceu-se para me ajudar! Não são os revoltados ou insatisfeitos que prosperam, mas sim aqueles que se contentam com o que tem:
“De fato, grande fonte de lucro é a piedade com o contentamento” (1 Tm 6.6).
Todos temos uma medida, uma capacidade de bens, atividades e relacionamentos determinada por Deus. Essa medida não deve ultrapassar o limite estabelecido por Deus, sob pena de tornar-nos inúteis para a obra divina. Quando nos sentimos hiperativos, abarrotados de bens e exauridos interiormente, devemos nos aquietar e desacumular.
Pode às vezes parecer um assunto de somenos importância, mas se você observar, verá que o contentamento foi registrado pelo Espírito Santo como uma das práticas proféticas que preparavam a vinda do Messias:
“Também soldados lhe perguntaram: E nós, que faremos? E ele lhes disse: A ninguém maltrateis, não deis denúncia falsa e contentai-vos com o vosso soldo” (Lc 3.14).
Quanto mais nos dias atuais, dominados pela mania de “ter” e o afã de comprar sempre o último modelo de algo que até já possuímos, precisamos ser despertados pela palavra profética que ressoa dizendo: “Contentai-vos com o vosso salário”! Eis aqui a riqueza que temos a repartir. Se vivemos com simplicidade voluntária e contentamento, nos surpreenderemos com o dinheiro que sobra. E não estou falando de um despojamento radical de nossos bens em favor dos pobres. Refiro-me a viver uma vida singela, que aspire apenas ao que Deus nos concede. Em uma analogia com a lei, é não colhermos o que deve ficar para o pobre:
“E não façam uma segunda colheita nas plantações de uvas, para colherem os cachos que ficaram, nem voltem atrás para catarem os cachos que tiverem caído no chão. Deixem isso para os pobres e para os estrangeiros. Eu sou o Eterno, o Deus de vocês” (Lv 19.10 — Bíblia na Linguagem de Hoje)
A maior luta, como é de praxe, ocorrerá em nosso interior. Os valores deste mundo são a antítese do contentamento. No entanto, a mordomia cristã torna claro que quanto maiores minhas posses, mais responsabilidade tenho. Como disse Moody sobre Tiago 2.5: “O homem pobre pode ser rico apenas na fé, mas o rico precisa ser rico em boas obras”. Se Deus me abençoa com um excedente de provisões, chamo isso de riquezas, e as dedico a Deus diligentemente, em favor do pobre. Pois a alma contente sabe que Deus lhe proveu o básico, e o que excede a isso deve ser revertido, amorosamente e num gesto de louvor a Deus, em benefício do evangelho voltado ao pobre.
Eliasaf de Assis é sociólogo, conferencista e diretor da Escola Cristã de Ensino Fundamental da Vila Prudente em São Paulo – SP.