Por: Lois J. Stucky
A pequena casa servia de sala de aula para cerca de doze crianças, meus alunos, filhos dos missionários americanos em Serra Leoa, na África. Da janela, via-se o pequeno cemitério, que eu havia visitado algumas vezes, andando entre as lápides simples e gastas que marcavam as covas dos missionários de outra geração, que para ali chegaram trazendo o Evangelho, cinqüenta ou sessenta anos antes.
As datas nessas lápides mostravam que a chama viva em alguns desses jovens missionários só ardera por poucos anos naquela terra assolada por doenças, antes que seus corpos fossem baixados à sepultura. Junto com eles foram enterradas também as belas, ardentes esperanças de resgatar as almas das pesadas trevas espirituais daquele país. Cada vez, meu coração ficava compungido ao honrá-los em silêncio por sua corajosa devoção e obediência, enquanto perguntava a mim mesma o que o Deus fiel teria guardado na eternidade para aqueles que, seguindo seu Mestre, caíram como sementes no solo e morreram para dar fruto (Jo 12.24).
Ouvi dos lábios de Grace, uma missionária idosa que ali continuava servindo a Deus, a seguinte história. Depois da morte desses primeiros jovens missionários, a junta de missões, lá em sua pátria de origem, lançou um solene apelo aos estudantes na escola de treinamento: Quem tomaria o lugar daqueles que haviam caído?
Como aqueles estudantes devem ter sondado os seus corações nos dias a seguir! Depois de um tempo, ficaram sabendo que uma jovem se oferecera para ir. “Quem será?”, perguntavam-se os estudantes. Quem estaria querendo pôr a vida em perigo por amor a Jesus?
Quando chegou a hora, a jovem voluntária Grace embarcou para a terra do chamado de Deus e ali serviu fielmente por muitos anos. Foi ali também que ela conheceu o missionário que Deus separara para ser seu esposo. No tempo certo, o Senhor concedeu-lhes também o privilégio de serem pais do primeiro bebê branco nascido em Serra Leoa. Mais tarde, Deus concedeu-lhes mais um filho. Ambos, ao chegarem à idade certa, responderam ao chamado de Deus para servi-lo na “África Negra”, no mesmo lugar em que haviam aprendido a língua e os costumes durante a sua criação. Serviram bem e por muito tempo. Uma neta e um neto, também ali nascidos, devotaram alguns anos a Deus naquela que para eles era a terra natal.
O Senhor está edificando sua Igreja em todo o mundo. Alguns podem semear, até mesmo a própria vida, enquanto outros colhem. Deus tem um lugar para cada um de nós, segundo seu grande plano.
“Por serviço ou por sacrifício”
Um antigo lema missionário, que alguns já devem ter ouvido, é: “Por serviço ou por sacrifício”. Podemos confiar inteiramente no coração de Deus, que determina qual dos dois será para cada um de nós. Esse lema encaixa-se perfeitamente em todo aquele que quer seguir as pegadas do nosso Senhor. O próprio Deus nos chama a adotá-lo quando, através das palavras do apóstolo Paulo em sua carta aos Romanos, ele nos roga “pelas misericórdias de Deus” a nos apresentarmos “como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o [nosso] culto racional” (12.1).
Embora o chamado seja para todos, a resposta e a aplicação terão de ser muito pessoais para cada um de nós. “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me” (Mt 16.24). Deus repetiu essa palavra em Marcos (8.34) e Lucas (9.23). Negar-se voluntariamente a si mesmo e atender pessoalmente ao chamado de Deus para servi-lo onde e quando ele determinar é a única resposta correta, que deve ser dada com alegria em face do sacrifício de Cristo por nós e das bênçãos eternas que nos advirão.
Como necessitamos da ajuda de Deus para chegar ao final da nossa vida sem abandonar nem transigir com a nossa cruz! É mais fácil pegar a cruz do que carregá-la até o fim. Bem-aventurado aquele que persevera. A cruz pode significar atravessar o oceano com o Evangelho e ir para algum lugar solitário e hostil. Ou, como em alguns casos que conheço, pode significar passar a vida preso, desde jovem, a uma cadeira de rodas e, mesmo assim, servir ao Senhor como obreiro fiel por meio da oração. Muitos de nós estamos em alguma posição intermediária entre esses opostos, mas “há uma cruz para cada um e há uma cruz para mim” (letra de um hino).
Nos versos de um hino de Elizabeth C. Clephane (música escocesa, 1830-1869), vemos o coração de uma mulher que tomou sua cruz para servir com amor, alegria e desprendimento aos pobres e aos deficientes, sem se importar com sua própria falta de saúde:
Desejo estar à sombra da cruz do Salvador;
Nenhum fulgor anseio senão o da face do meu Senhor;
Contente em viver longe das ambições e conquistas deste mundo,
A não tomar conhecimento nem de ganho nem de perda,
Minha natureza pecaminosa, minha única vergonha,
Minha única glória, a cruz.
Não é somente nas decisões grandiosas, mas também nos pequenos impasses diários que temos de fazer escolhas decisivas. É o cristão cheio do Espírito que tem condições de, pelo Espírito, mortificar seus desejos e planos egoístas. Muitas vezes é uma escolha entre o bom, o melhor e o máximo. O que é que eu preciso abandonar, dos meus interesses pessoais, para investir mais tempo, talentos e recursos para o Senhor e para as almas que ele ama e quer que seu povo alcance?
Paulo exorta os coríntios a não receberem a graça de Deus em vão (2 Co 6.1). Todo o louvor ao nosso Salvador, o qual não considerou ser inútil vir à Terra e sofrer e morrer por nós! Agora ele recebeu a recompensa, “coroado de glória e de honra” (Hb 2.9). Que o propósito desse grande sacrifício, em toda sua plenitude, seja consumado em nós e por nosso intermédio. Isso acontecerá quando nos apresentarmos como sacrifício vivo e contínuo. Enquanto escrevo essas palavras, sinto com pesar quão pouco tenho vivido isso em minha vida.
O grande zelo de Paulo pelo Senhor e pelo seu Reino é a prova de que o amor de Deus estava em seu coração: “Pois o amor de Cristo nos constrange, julgando nós isto: um morreu por todos; portanto todos morreram. E ele morreu por todos para que os que vivem não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou” (2 Co 5.14). Paulo nos conclama à obediência, como lemos em sua segunda carta aos coríntios, quando diz que “importa que todos nós compareçamos perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo” (5.10). Quanta atenção devemos dar a essas palavras se quisermos comparecer diante de Deus com confiança naquele dia – o que certamente todos nós desejamos!