9 de dezembro de 2024

Ler é sagrado!

Confiança e coragem em meio à tempestade

Por Charles H. Spurgeon (1834-1892)

“Portanto, senhores, tende bom ânimo! Pois eu confio em Deus que sucederá do modo por que me foi dito” (At 27.25).

A presença de uma pessoa corajosa na hora do perigo é um grande conforto para seus companheiros. É grandioso observar Paulo tão ousado, tão calmo em meio à agitação da tempestade, falando tão alegremente e de forma tão encorajadora à tripulação, aos soldados e prisioneiros. Você deve ter visto em muitos acontecimentos na história que um único homem, no final, vence a batalha: todos os outros desempenham bem suas funções quando um único espírito heroico levanta o estandarte.

Lembre-se, cristão, que onde quer que tenha sido colocado, você deve ser essa pessoa, buscando coragem, independência de espírito e força interior da parte de Deus, para que com isso possa confortar os mais fracos ao seu redor. Assim, aja para que sua confiança em Deus fortaleça as mãos fracas e firme os joelhos fracos, que seu olhar calmo e tranquilo diga aos que têm um coração temeroso: “Sejam fortes, não temam”.

Se quiser fazer isso (e confio que se empenhará de fato), seja no quarto de doentes, em meio aos problemas da vida, na igreja e em qualquer outro lugar, você mesmo terá de ser forte. Tome como uma boa regra que nada poderá ser comunicado aos outros que já não esteja em você. Você não pode dar um verdadeiro encorajamento a outras pessoas a menos que já tenha coragem dentro de si mesmo.

Agora, a razão pela qual Paulo foi capaz de animar seus companheiros foi que ele se encorajava em seu Deus; ele estava calmo, pois de outra forma não poderia ter acalmado aqueles que estavam ao seu redor. Imaginem-no nervoso e trêmulo, e ainda dizendo: “Senhores, tenham bom ânimo”. Eles teriam pensado que zombava deles e teriam respondido: “Senhor, primeiramente tenha você mesmo bom ânimo, antes de querer nos encorajar”.

Por isso, meu caro irmão, confie em Deus, seja calmo e forte; caso contrário, não será tão útil para o mundo e para a igreja como deveria ser. Torne-se cheio e ainda transbordante, pois nunca poderá encher os outros enquanto você mesmo não estiver cheio. “Sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder” (Ef 6.10), e então será um exemplo forte para os tímidos que o seguirão.

Paulo era forte poque cria. A fé torna os homens fortes, não na mente, mas no coração.

“Eu creio em Deus”

Perceba que a fé de Paulo era fé em Deus. “Eu creio em Deus”, disse ele. Ninguém mais no navio conseguia ter qualquer esperança em Deus. Com exceção de um ou dois que partilhavam da mesma opinião de Paulo, pensavam que Deus os estava abandonando, se é que de fato pensavam em Deus. Mas, naquela noite, estava ao lado de Paulo um anjo recém-chegado do céu, resplandecente com a presença divina, e, fortalecido pela sua mensagem, Paulo disse: “eu creio em Deus”. Isso foi algo maior do que apenas dizer: “creio em um Deus”. Muitos o dizem dessa maneira e conseguem algum conforto, ainda que pequeno. Porém, quando Paulo disse “eu creio em Deus” – crendo de fato nele, na sua veracidade, em suas palavras, nas suas misericórdias e no seu poder –, isso fez com que ele se mantivesse calmo, em paz, forte. Quisera Deus que todos os que se dizem cristãos cressem de fato nele.

Ao crer em Deus, ele creu na mensagem que Deus o havia enviado, bebendo de cada palavra e sendo vivificado por ela. Deus havia dito: “Não temas Paulo, eu livrei a todos os que navegam contigo”. Ele creu nisso. Sentiu-se seguro de que Deus, tendo prometido, era capaz de cumprir sua palavra; e, no meio do uivo dos ventos, Paulo agarrou-se a essa promessa. Ele tinha certeza de que não cairia um fio de cabelo da cabeça de nenhum homem. O Senhor tinha dito a palavra preservadora, e isso era suficiente para seu servo. Será que Deus diria algo e não o faria? Será que ele prometeria, e não o cumpriria? Paulo cria que Deus faria tudo conforme lhe fora dito.

E ele fez isso – lembrem-se disso, caros amigos – quando não havia mais nada em que se acreditar. “Eu creio em Deus”, disse ele. O feroz Euroaquilão [o tufão; At 27.14] fustigava a embarcação de um lado para outro, conduzindo-a em direção à costa; mesmo assim, ele disse calmamente: “eu creio em Deus”. Isso é uma coisa grandiosa: crer em Deus quando os ventos sopram, quando as ondas uivam como se fossem animais selvagens e, quando elas vêm uma após outra como se fossem uma matilha de lobos, todas procurando devorá-lo. “Eu creio em Deus”. Essa é a verdadeira pureza da fé, do tipo que pode enfrentar uma tempestade.

É comum entre os homens a chamada fé dos bons tempos, a fé que adora ver a sua bela imagem na superfície de um espelho, mas que desaparece quando as nuvens de tempestade comandam a batalha. A fé dos eleitos de Deus é a fé que pode enxergar no escuro, a fé que se mantém calma em meio à turbulência, a fé que faz cantar em meio à tristeza, a fé que brilha mais forte quando tudo à sua volta é escuro como a meia-noite. “Eu creio em Deus”, disse ele, quando não havia mais nada em que acreditar.

Somente em Deus, ó minha alma, espera silenciosa, porque dele vem a minha esperança” (Sl 62.5). Diga, ó minha alma: “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente nas tribulações. Portanto, não temeremos ainda que a terra se transtorne e os montes se abalem no seio dos mares” (Sl 46.1-2).

Deus ainda vive!
Confia, minha alma, e não temas o mal;
A enorme abóbada do céu pode fender-se,
O globo da terra pode, em ruínas, explodir;
A fúria do diabo pode trovejar,
A morte e o inferno podem mostrar o seu pior;
Mas Deus manterá seguros e firmes
Aqueles que confiam nele resolutamente;
Por que então, minha alma, esse desespero?
No meio do naufrágio, Deus está presente.

Fé genuína toma posição pública

Como o apóstolo Paulo cria em Deus de fato, ele não tinha acanhamento de manifestar sua fé. Ele disse abertamente a todos os que o rodeavam: “Nenhum de vocês perderá nem mesmo um fio de cabelo, porque eu creio em Deus”.

Agora, não é tão fácil abrir a sua fé e expô-la em condições adversas ou diante de homens difíceis. Muitos creem na promessa, mas não querem afirmá-la, pois há um sussurro na sua alma: “Pode ser que não se torne realidade, e isso dará oportunidade para o inimigo se regozijar! Como aqueles que me ouvirem se entristecerão quando descobrirem que eu estava enganado”. Assim o diabo faz com que a fé se torne muda e Deus despojado de sua honra. Sob o nome da prudência, esconde-se um egoísmo incrédulo. Irmão, empreste-me o seu ouvido para que eu possa sussurrar nele: “É você que não está crendo na promessa”. Esse não é o tipo legítimo de fé.

Fé genuína em Deus se manifesta publicamente e afirma: “Deus é verdadeiro, e eu vou apostar tudo em sua palavra”. Ela não engole as próprias palavras nem guarda para si os seus pensamentos; quando chegar o momento e outros estiverem em dificuldades ou dúvidas, ela é capaz de animá-los proclamando: “eu creio em Deus”. Ela não tem vergonha de dizer: “O Senhor Jesus, de quem sou e a quem sirvo, esteve ao meu lado esta noite e falou comigo; por isso, posso afirmar o que ele disse”.

Um chamado para os crentes

Gostaria que todos os cristãos estivessem preparados para aceitar o desafio e tomar posição abertamente; pois se Deus não for verdadeiro, não finjamos confiar nele; e, se o Evangelho for uma mentira, sejamos honestos o suficiente para assumir que é assim. Mas, se for verdade, por que razão deveríamos duvidar e falar com falta de convicção? Se a promessa de Deus for verdadeira, por que devemos desconfiar dela? Que desculpa há para esta hesitação? “Oh”, diria alguém, “é porque existem grandes riscos.” Riscos com Deus? Riscos sobre Deus manter sua palavra? Não pode ser. “Seja Deus verdadeiro, e mentiroso, todo homem…” (Rm 3.4). Que o céu e a terra voltem ao caos, mas o Altíssimo jamais poderá quebrar sua palavra ou fugir de sua promessa. Portanto, ó servo de Deus, se receber uma mensagem do Altíssimo, divulgue-a pelos quatro cantos e torne conhecida a sua fé.

Gostaria que essa palavrinha caísse nos ouvidos de alguns que pensam amar a Cristo, mas que nunca declararam o seu amor; você que está escondido aí nas sombras: saia e se manifeste!

Quanto a você, que há muito tempo declara sua confiança no seu Salvador, faça-o cada vez mais, e

Proclame a palavra de Deus,
Mesmo que esteja na presença de reis ou autoridades;
Não ceda ao pecado da vergonha.

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