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Jesus – Nascido para Morrer
Adolph Saphir (1831-1891)
Este é o grande mistério da natureza divina, que o próprio Deus desceu à terra; que o próprio Deus visitou seu povo, que o Filho de Deus tornou-se homem.
Mas enquanto reverenciamos o grande mistério da Encarnação, lembremos que, necessariamente, ela nos leva à Crucificação. O mistério da manjedoura envolve o mistério da Cruz.
Lembre-se, pois, que o grande propósito da Encarnação não foi simplesmente visitar a humanidade, mas redimi-la. A intenção do Pai foi enviar Cristo como substituto, para que os pecadores fossem salvos. Quando o Filho de Deus disse: “Eis aqui estou”, referia-se à sua Encarnação, a Belém. Mas quando acrescentou: “para fazer a tua vontade”, ele pensava no Calvário, em sua expiação, em sua morte no madeiro maldito, o justo pelo injusto (Hb 10.9). Ele veio de boa vontade, com alegria, nascido da virgem Maria, para fazer a vontade pela qual “fomos santificados pela oferta do corpo de Jesus Cristo, feita de uma vez por todas” (Hb 10.10). Ele nasceu para que fosse morto. Veio para entregar sua vida como resgate. Assumiu nossa natureza para que pudesse se oferecer como sacrifício. Tornou-se Homem para poder ser o substituto e a justificação do homem.
Foco em sua morte
Por esse motivo, observamos que, em vida, nosso Senhor constantemente esperava o momento de sua morte. Como ele se distingue dos outros homens! O homem comum sempre fala das grandes obras que pretende realizar em vida, das ações e planos para os quais devota suas energias. Jesus sempre falava sobre o que realizaria com sua morte. Enquanto o homem comum enxerga na morte o limite e o fim da sua obra, Jesus considerava a morte a sua grande e gloriosa obra, a origem e o princípio da sua influência eterna e verdadeira.
Relembre rapidamente o Evangelho de João e veja como a morte de Cristo nos é constante e enfaticamente exposta. Logo no primeiro capítulo, Jesus é apresentado como o Cordeiro a ser sacrificado pelos pecados. Quando aparece pela primeira vez em Jerusalém, ele reflete sobre sua morte e sobre a destruição e reconstrução do Templo. Em sua conversa com Nicodemos, Jesus revela o mistério da crucificação: importava que o Filho do Homem fosse levantado, o sacrifício do amado Filho de Deus. Quando fala do pão da vida que desce do céu, ele não se refere a seus ensinamentos nem a seu exemplo, mas declara: “o pão que eu darei pela vida do mundo é a minha carne” (Jo 6.51). Ele se denomina o Bom Pastor (Jo 10.11), não porque cuida do rebanho, levando-o a pastos verdejantes, junto a águas tranquilas, mas porque ele dá sua vida pelas ovelhas, como o Pai lhe ordenara. Quando os gregos chegam à festa e desejam ver Jesus, ele, contemplando em espírito sua futura Igreja, novamente fala da morte que deverá, antes de tudo, ser consumada – o grão de trigo ficará só, se não cair na terra e morrer.
Desde o início de seu ministério, a Cruz esteve diante dos olhos de seu coração. Para esse grande mistério de salvação, ele continuamente direcionou seus discípulos; para esse grande mistério de salvação, ele continuamente nos conduz por meio de seu Espírito – Jesus Cristo crucificado. Este é o Filho de Deus, nosso Messias, nosso tudo em todos, nossa esperança na terra, e nossa alegria nos céus.
Fonte de amor e esperança
Jesus Cristo crucificado! Esse é o fundamento de nossa fé, a nascente de nosso amor, a fonte de nossa esperança.
Dizemos ao pecador: “Eis o Cordeiro de Deus!” (Jo 1.29). Qualquer que seja sua condição atual, e qualquer que seja sua vida hoje, aquiete-se e veja o livramento que o Senhor trará. Nossa salvação desceu dos céus; é presente do Pai; suas raízes não estão no coração ou caráter do homem; procedem da plenitude da divina misericórdia – Jesus Cristo crucificado. “Olhai para mim e sereis salvos…” (Is 45.22).
Dizemos ao crente em cada estágio de seu progresso rumo à Jerusalém celestial: “Mantenham-se pobres e necessitados, seja Cristo tudo em todos; por meio dele recebemos de Deus justiça nos céus, santificação em nosso coração e em nossa vida na terra”.
Essa é a fonte do amor. Podemos estar conscientes dos benefícios que Deus nos concede, refletindo com gratidão sobre a mão generosa e o coração paternal que nunca se cansam de nos abençoar e de nos guardar; podemos sentir admiração, adoração e doce anseio quando contemplamos sua infinita bondade e pureza. Mas não sentimos o ardente amor de Deus até vermos o Salvador crucificado. É nesta hora que o Espírito Santo derrama o amor de Deus em nosso coração.
Essa é nossa esperança. Nada mais pode sustentar o cristão durante suas provações, aflições e enfermidades. “Aquele que não poupou nem o próprio Filho, mas, pelo contrário, o entregou por todos nós…” (Rm 8.32) – nenhum argumento de menor importância conseguirá nos confortar e sustentar na tristeza e na dificuldade. “Cristo Jesus é quem morreu, ou, pelo contrário, quem ressuscitou dentre os mortos…” (Rm 8.34). Esse é nosso único refúgio e torre forte nas tentações e incertezas.
Ah, a doce antecipação que temos do céu em momentos de sofrimento, quando constatamos a bondade do misericordioso e compassivo Sumo Sacerdote, e quando ele nos assegura, por meio do seu Espírito, que ele se angustia em todas as nossas angústias, e todos participaremos com ele de sua bem-aventurança e glória! Em Jesus Cristo crucificado está nossa esperança.
Per crucem ad lucem. Através da Cruz para a luz. É assim que Deus opera. Porventura, não convinha que o Cristo padecesse e entrasse na sua glória? Através de muitas tribulações a Igreja entrará no reino de Deus. Desprezada e rejeitada entre os homens, não possui força, esplender ou riquezas próprias, mas segue ao Senhor, que se fez pobre, que se humilhou, que foi obediente até à morte de cruz, para que todo o poder e glória sejam dados a seu Deus e a nosso Deus, a seu Pai e nosso Pai. Amém.
– Adaptado de Christ Crucified por Adolph Saphir.