9 de dezembro de 2024

Ler é sagrado!

Última Palavra: Será que a Oração faz Deus Mudar de Idéia?

Por Christopher Walker

Uma das maiores controvérsias teológicas relacionadas com o assunto da oração envolve a seguinte pergunta: A minha oração pode fazer Deus mudar de idéia?

Há vários artigos nesta edição da revista que ajudam a examinar os diferentes aspectos do mistério da oração, o qual  sintetiza, de certo modo, o imenso mistério da interação entre Deus e o homem. Quem toma iniciativa, Deus ou o homem? Se o homem não corresponde ou não age, Deus fica atado? Onde fica a soberania de Deus? Onde fica a responsabilidade humana?

Seria impossível, em poucas linhas, tratar adequadamente  assunto tão extenso, nem teria, por um instante, a presunção de achar que tenho as chaves para o pleno entendimento dele. Afinal, seria o mesmo que achar que compreendo todo o mistério da divindade. Gostaria, apenas, de chamar a atenção para um aspecto desse assunto de fazer Deus mudar de idéia através da oração.

Um dos exemplos muito citados na Bíblia a esse respeito é a intercessão de Moisés nas duas ocasiões em que Deus declarou sua intenção de destruir todo o povo de Israel e formar uma nova nação a partir da descendência do próprio Moisés (Êx 32.10-14; Nm 14.11-22). O texto em Êxodo é muito forte: “Então, se arrependeu o Senhor do mal que dissera havia de fazer ao povo” (Êx 32.14).

Embora as três Pessoas da trindade sejam um só Deus, elas são distintas o suficiente para ter comunhão, para conversar entre si, para procurar glória uma para a outra, para se amarem e assim por diante. E também são distintas o suficiente para ter funções diferentes: o Pai origina tudo, o Filho expressa e revela, o Espírito executa.

Assim sendo, podemos admitir a seguinte situação dentro da divindade: por um lado, existe sua natureza inegociável de santidade e justiça, que não tolera iniqüidade e  requer castigo e juízo para eliminá-la; por outro, temos sua misericórdia e compaixão, que não deseja que ninguém pereça, e que o levou a dar sua própria vida para solucionar o dilema.

Alguns tentam humanamente separar esses aspectos nas diferentes Pessoas da Divindade. O Pai representa a natureza de santidade, e sua figura é vista mais como a de um Juiz, prestes a exercer juízo sobre as infiéis criaturas humanas. O Filho representa o amor e a misericórdia, e geralmente o imaginamos como alguém com olhar meigo e compassivo. Embora essa distinção possa ter seu valor, não corresponde, por completo, à revelação das Escrituras. Jesus certamente não tinha uma expressão muito meiga quando expulsou os cambistas do templo nem quando repreendeu severamente os escribas e fariseus. E foi o Pai que se agradou em entregar o Filho à morte por nossa causa (Is 53.10), tamanho o seu amor e compaixão por um mundo perdido.

Voltando à questão inicial: a intercessão pode fazer Deus mudar de idéia? Sim, se compreendemos que fomos convidados, pela infinita misericórdia de Deus, a participarmos do maior drama, das mais profundas paixões, da mais íntima interação e relacionamento que possa existir: do confronto e do diálogo entre a justiça e a misericórdia divinas. Embora só exista um sacrifício de expiação pelos pecados, pelo mesmo Espírito que levou o Filho a se entregar em nosso favor, nós também podemos nos entregar para apresentar a um Deus justo e imutável as súplicas por misericórdia baseadas naquela obra expiatória. Assim preenchemos, como diz o apóstolo Paulo, “o que resta das aflições de Cristo, na minha carne, a favor do seu corpo, que é a igreja” (Cl 1.24).

Todas as vezes que a Escritura fala que Deus se arrependeu, a situação está relacionada com a necessidade que ele tem de julgar a humanidade por causa do pecado. Nunca se trata de um desvio do propósito ou do plano de Deus. Ele pode passar por mil obstáculos, mas nunca deixará de caminhar para seu alvo final. Ele nunca muda de idéia em relação ao seu objetivo.

E não pense, por um instante, que esse conflito entre seu juízo e seu amor é um mero jogo que ele faz; que no fim a misericórdia triunfa, e que ele nunca faz nada muito drástico. Não estamos falando de uma decisão mecânica, sem sentimentos, puramente racional. Quem pensa que paixão máxima é a atração carnal ou sentimental entre homem e mulher nem começou a conhecer o verdadeiro Deus ou a história do seu plano. Assim como Deus é infinitamente maior que o homem, suas paixões são infinitamente mais fortes e mais profundas que as nossas. Quando Deus falou com Moisés que queria destruir Israel, ele estava falando sério!

O que podemos concluir, então? Deus mudou de idéia por causa de Moisés? Sim, mas ele mudou porque encontrou em Moisés o mesmo Espírito que habitava em Jesus. O mesmo Deus que é um fogo consumidor, que sente profundos ciúmes e ira contra o pecado e a infidelidade, desejava ardentemente ser confrontado com sua natureza de compaixão e fidelidade às suas promessas. Em Números 14, Moisés usou a revelação do nome e da natureza de Deus, que o próprio Deus lhe dera no monte santo, para argumentar com ele contra sua decisão.

Podemos dizer, com muita reverência e pouco conhecimento, que é esse mesmo tipo de interação que ocorre dentro da própria divindade. O Filho vive para interceder por nós (1 Jo 2.1,2). Só que agora, de forma totalmente impensável e imerecida, ele permite que nós também façamos parte, pelo seu Espírito, dessa interação divina que se chama intercessão.

Quando falamos em Deus mudar de idéia, então, lembremos que na intercessão aprendemos apenas a sentir e a suplicar em harmonia com aquilo que a própria natureza divina mais anseia ouvir. Deus é o primeiro a se regozijar quando a misericórdia triunfa sobre o juízo (Tg 2.13).

Christopher Walker faz parte do Conselho Editorial da revista Impacto e reside em Americana, SP.  E-mail: [email protected]

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Respostas de 5

  1. Que bom! Parabéns! Um texto que não tenta encher a cabeça do leitor com argumentação filosófica e exemplos de comportamento humano para tentar dizer que a passagem bíblica não está dizendo aquilo que diz. A bíblia está repleta de exemplos de que Deus mudou algo que estava para fazer ou uma situação em resposta à atitudes de homens.

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